Motes e Glosas

Publicação: 07/07/2015 03:00

Valéria Barbalho
Médica
valeriageni@gmail.com

O grande poeta pernambucano de Tabira, João Alderney Pires, frequentemente envia e-mail aos amigos, com ótimos motes para que eles façam glosas. Uma verdadeira roda de poesia virtual. Recentemente ele organizou glosas para o lindo mote: “Posso até esquecê-la, mas se um dia / Me arrancarem do peito o coração!”, e em breve, lançará o “Cordel Coletivo”. Serão 32 estrofes escritas por 27 poetas glosadores, que fizeram belíssimos poemas para esse mote. Sensacional! Fico encabulada toda vez que recebo um tema e não respondo, pois não sei fazer sextilhas, nem qualquer tipo de verso. Acho mais fácil atender crianças com “lombrigas, tosse e perebas”, afinal sou apenas uma Pediatra matuta.
Querendo dar uma satisfação para o João Alderney, que gentilmente insiste em me enviar seus motes, mesmo sem obter resposta (ele até me enviou o mote do Cordel Coletivo), resolvi copiar uns do meu pai. Todas as glosas são do célebre Major Sinval, o velhinho de aço, um Patrimônio Cultural do País de Caruaru. Transcrevi do livro (esgotado) de Nelson Barbalho, de 1976 - ”Major Sinval da Francesa”. Chega de papo e vamos para as poesias.
“No dia da minha morte, é que começo a viver”. O meu espírito forte / Vai reviver no futuro / Saindo do lodo impuro / “No dia da minha morte” / Quando tiver essa sorte / Será meu alvorecer / Terminará meu sofrer / Na estreita campa funérea / Deixando a podre matéria / “É que começo a viver”.
“Esta vida é um buraco / Do começo até o fim”. Vivemos como um macaco / Pequeno “Caxinguelê” / Por isso não vemos que / “Esta vida é um buraco” / Eu nela não dou cavaco / Vou vivendo mesmo assim / Não acho nada ruim / Levo tudo em brincadeira / E já subi a “ladeira” / “Do começo até o fim”.
“Quem pra cangalha nasceu/ Sela não há de botar”. Subiu pouco e já desceu / Volvendo de novo à lama / Pois não pode pegar fama / “Quem pra cangalha nasceu” / O tempo todo perdeu / Procurando se elevar / Devia se conformar / Não enfrentando a batalha / Porque besta de cangalha / ”Sela não há de botar”.
“Quem quer muito traz de casa/ Ou ao Governo se associa”. Eu aproveito esta vaza / Pra conselho proveitoso / Quero dizer ao guloso / ”Quem quer muito traz de casa” / Puxe o peixe â sua brasa / Faça muita economia / Pois, amigo, hoje em dia / Quem quer ser milionário / Passa a vida de usuário / “Ou ao governo se associa”.
“Se um dia faltar Sinval / Invento um de sabão”. Sou manso feito a pantera / Ligeiro que só preguiça/ Pesado tal qual cortiça / Quadrado como uma esfera / Por ter nascido em tapera / Sou fraco que nem leão / Humano feito um dragão / Mais negro do que a cal / “Se um dia faltar Sinval / Invento um de sabão”.
Para terminar deixo dois motes Nelseanos para Alderney glosar e, se quiser, compartilhar com os amigos poetas: “Prometeu tudo em começo / Mas bateu fofo no fim” e “Certo no Mundo é a morte / No mais é tudo ilusão!”. Pronto, fui me desculpar e acabei lançando um desafio. Inté!