Aldo Paes Barreto
Jornalista
Publicação: 25/04/2025 03:00
Há muitos e muitos anos, na próspera Ilha de Itamaracá, o cheiro intenso de jasmim chegava aos habitantes próximos à mangueira que vira nascer a trágica história de amor e perdição, vivida entre a adolescente Sancha Coutinho, filha de rico agricultor local, e o jovem Antônio Homem de Saldanha Albuquerque: a lenda da manga jasmim. Durante séculos, o cheiro da manga vencia a maresia e o odor forte vindo dos canaviais.
A lenda ganhou o mundo. A mangueira-mãe se propagava produzindo novas plantas. Quando o Imperador D. Pedro II esteve em Pernambuco, no final de 1859, fez questão de conhecer as mangas de Itamaracá. Saboreou o fruto e colheu uma folha para presentear a filha, Leopoldina, que ficara no Rio, escreveu ele no diário que manteve durante a viagem.
Duzentos anos antes, naquele mesmo lugar onde vira Sancha pela primeira vez, Antônio jurou que a mocinha seria sua esposa. Mas Antônio custou a aproximar-se da jovem. Quando conseguiu, no pátio da igreja de Nossa Senhora da Conceição, onde se reuniam as famílias mais abastadas da ilha depois da missa, ele ficou extasiado sem saber o que dizer. Sancha tomou a iniciativa e o afastou delicadamente dizendo que o pai não permitia que ela namorasse. Ameaçava mandá-la para um convento, em Portugal. Senhor do Engenho Andirobeira, João Paulo Vaz Coutinho tinha a fama de valente e não gostava de ser contrariado.
Depois daquele domingo, Sancha também ficou apaixonada pelo mancebo. Conversavam e trocavam juras de amor, através da mucama Inácia, cuidadora dela. Antônio criou coragem e procurou o senhor de engenho. Foi enxotado. Levou umas bordoadas de cipó quiri e terminou expulso da ilha. Perdeu o contato com Sancha. Quando soube que a amada fora enviada pelo pai para Portugal e ali morrera, a vida perdera o sentido.
Era o começo da invasão holandesa. Antônio alistou-se num dos primeiros batalhões de defensores da terra brasileira. Notabilizou-se pelos cuidados com os feridos e com os moribundos à espera da extrema-unção. As ações piedosas o levaram a frequentar o convento de Olinda. Bom aluno, concluiria os estudos em Roma. Do Vaticano seguiu para a África em missão da Igreja Católica até contrair a forma mais violenta da bexiga. A doença deixou profundas marcas no seu corpo e o rosto distorcido pelas feridas cicatrizadas. Mandado de volta para o Brasil, retornou a Olinda, quando ficou sabendo que Sancha não morreu. Quem morreram foram os pais. Ela vivia no engenho com o irmão.
No mesmo dia Antônio tomou a decisão de procurar a amada. Quando chegou ao engenho, Sancha estava no quintal colhendo uma manga. Ele bateu palmas. Sancha viu aquele padre estranho no portão. Não esperou pela criada. Alguma coisa a impulsiona em direção ao desconhecido. Quando chegou em frente ao padre e ele tirou o capuz, Sancha ficou em estado de choque. Era um estranho de aparência horripilante. Desmaiou. Antônio jogou-se aos pés da amada e em prantos maldizia sua sorte. Sancha morreria no dia seguinte. Antônio não voltou ao convento.
Vencido o luto, o padre passou a ir ao túmulo de Sancha todas as noites. Cuidava da mangueira próxima, irrigava as roseiras e dialogava com as três. Era um ritual. À beira do túmulo falava longamente com Sancha, fazia recomendação à mangueira, elogiava a formosura do roseiral. Certa vez foi visto pelos vizinhos que já tinham o diagnóstico pronto: o padre endoidou mesmo. Agora deu para conversar com a finada e com as flores. Não deixavam de ter razão.
Assim como as rosas, as mangas não falam...”simplesmente exalam o perfume que roubam de ti...” (Cartola)
A lenda ganhou o mundo. A mangueira-mãe se propagava produzindo novas plantas. Quando o Imperador D. Pedro II esteve em Pernambuco, no final de 1859, fez questão de conhecer as mangas de Itamaracá. Saboreou o fruto e colheu uma folha para presentear a filha, Leopoldina, que ficara no Rio, escreveu ele no diário que manteve durante a viagem.
Duzentos anos antes, naquele mesmo lugar onde vira Sancha pela primeira vez, Antônio jurou que a mocinha seria sua esposa. Mas Antônio custou a aproximar-se da jovem. Quando conseguiu, no pátio da igreja de Nossa Senhora da Conceição, onde se reuniam as famílias mais abastadas da ilha depois da missa, ele ficou extasiado sem saber o que dizer. Sancha tomou a iniciativa e o afastou delicadamente dizendo que o pai não permitia que ela namorasse. Ameaçava mandá-la para um convento, em Portugal. Senhor do Engenho Andirobeira, João Paulo Vaz Coutinho tinha a fama de valente e não gostava de ser contrariado.
Depois daquele domingo, Sancha também ficou apaixonada pelo mancebo. Conversavam e trocavam juras de amor, através da mucama Inácia, cuidadora dela. Antônio criou coragem e procurou o senhor de engenho. Foi enxotado. Levou umas bordoadas de cipó quiri e terminou expulso da ilha. Perdeu o contato com Sancha. Quando soube que a amada fora enviada pelo pai para Portugal e ali morrera, a vida perdera o sentido.
Era o começo da invasão holandesa. Antônio alistou-se num dos primeiros batalhões de defensores da terra brasileira. Notabilizou-se pelos cuidados com os feridos e com os moribundos à espera da extrema-unção. As ações piedosas o levaram a frequentar o convento de Olinda. Bom aluno, concluiria os estudos em Roma. Do Vaticano seguiu para a África em missão da Igreja Católica até contrair a forma mais violenta da bexiga. A doença deixou profundas marcas no seu corpo e o rosto distorcido pelas feridas cicatrizadas. Mandado de volta para o Brasil, retornou a Olinda, quando ficou sabendo que Sancha não morreu. Quem morreram foram os pais. Ela vivia no engenho com o irmão.
No mesmo dia Antônio tomou a decisão de procurar a amada. Quando chegou ao engenho, Sancha estava no quintal colhendo uma manga. Ele bateu palmas. Sancha viu aquele padre estranho no portão. Não esperou pela criada. Alguma coisa a impulsiona em direção ao desconhecido. Quando chegou em frente ao padre e ele tirou o capuz, Sancha ficou em estado de choque. Era um estranho de aparência horripilante. Desmaiou. Antônio jogou-se aos pés da amada e em prantos maldizia sua sorte. Sancha morreria no dia seguinte. Antônio não voltou ao convento.
Vencido o luto, o padre passou a ir ao túmulo de Sancha todas as noites. Cuidava da mangueira próxima, irrigava as roseiras e dialogava com as três. Era um ritual. À beira do túmulo falava longamente com Sancha, fazia recomendação à mangueira, elogiava a formosura do roseiral. Certa vez foi visto pelos vizinhos que já tinham o diagnóstico pronto: o padre endoidou mesmo. Agora deu para conversar com a finada e com as flores. Não deixavam de ter razão.
Assim como as rosas, as mangas não falam...”simplesmente exalam o perfume que roubam de ti...” (Cartola)