Brasil biodiverso é Brasil sem fome

Renata Nascimento
Jornalista e presidente associada da UNA - União Namastê de Agroecologia

Publicação: 21/05/2025 03:00

Às vésperas da COP30, que ocorrerá em Belém do Pará, entre 10 e 21 de novembro, o Brasil tem diante de si uma escolha civilizatória: seguir reproduzindo um sistema agroalimentar destrutivo ou liderar uma transição regenerativa que inspire o mundo. A crise climática, a fome e a destruição da biodiversidade exigem ações concretas — e a agricultura está no centro dessa solução.

O Acordo de Paris propõe limitar o aquecimento global a 1,5°C. Segundo a FAO, até 30% das emissões vêm do sistema alimentar. O agronegócio baseado em monoculturas, transgênicos e venenos degrada biomas, concentra renda e compromete nossa saúde.

Mas há alternativas. A agroecologia e a agrofloresta, como mostra o Rodale Institute, podem sequestrar mais de 100% das emissões globais anuais de CO%u2082, regenerando solos e biodiversidade. Além disso, produzem entre 20 e 70 toneladas de alimento por hectare/ano — enquanto a soja gera apenas 3,7 toneladas.

A pesquisa “O Brasil que o Brasil quer ser”, encomendada pelo presidente, revela o desejo por um país sustentável, justo e protagonista climático. Isso exige um plano nacional de transição agroecológica, com metas de substituição de monoculturas por sistemas biodiversos, incentivos fiscais, valorização da biodiversidade e apoio à agricultura familiar.

Ainda há tempo de evitar que o céu caia, como alerta Ailton Krenak. Para isso e para cumprir com os compromissos assinados no acordo de Paris, o Brasil campeão de biodiversidade, mas também de consumo de agrotóxicos, precisa de uma política de transição agroecológica agroflorestal urgente.

A agricultura familiar, indígena e quilombola pode protagonizar essa virada, com apoio ao associativismo, Sistemas participativos de certificação orgânica e manejo agroflorestal. Isso só será viável com universidades, CNPq, IPA e extensão rural, acompanhando indicadores da transição.

Cinturões verdes nas cidades, urbanismo de comunidades verdes e redes de mercados agroecológicos da agricultura familiar nos bairros podem reconectar campo e cidade, aliviar desastres e libertar agricultores da dependência das feiras.

A fome não é falta de produção, mas de distribuição. E a subnutrição nasce de um sistema que valoriza o biscoito recheado em vez da fruta. A agrofloresta é a tecnologia mais eficiente para enfrentar a crise climática, a fome e a desertificação — e está alinhada às soluções baseadas na natureza reconhecidas pela ONU e IPCC.

Chegou a hora de alinhar discurso e prática. A COP30 é a chance de mostrar que o Brasil não é só o país que degrada, mas o país da regeneração. Que sejamos lembrados não como celeiro de commodities tóxicas, mas como berço de uma nova civilização alimentar.