Segurança em Boa Viagem: uma análise multidimensional e caminhos para a ação

Otavio Moraes
Professor, sociólogo, mestre em administração, empresário e membro do conselho de empresas e de associações empresariais

Publicação: 25/06/2025 03:00

O bairro de Boa Viagem, no Recife, Pernambuco, enfrenta um desafio de segurança que, embora localizado, ecoa uma problemática global. A preocupação de grupos empresariais locais sublinha a urgência de uma abordagem que vá além da atuação policial, reconhecendo a complexidade do cenário e a interconexão de fatores causais. A segurança não é um problema exclusivo da esfera pública; ela é um reflexo de dinâmicas socioeconômicas e de lacunas em políticas públicas e privadas.

As variáveis causais: além da segurança pública
Para combater efetivamente a insegurança, é fundamental compreender e atuar sobre as quatro variáveis que a alimentam:

Economia
A estagnação econômica e a falta de oportunidades geram desespero e, em muitos casos, impulsionam a criminalidade. Em Boa Viagem, como em outras áreas, a ausência de um ambiente econômico próspero pode levar ao aumento de furtos, roubos, tráfico e outras infrações.

Qualificação da mão de obra vs. empregabilidade

A desconexão entre a qualificação profissional disponível e as demandas do mercado de trabalho é um entrave significativo. Jovens e adultos sem perspectivas de emprego formal podem ser cooptados por atividades ilícitas, vendo na criminalidade uma saída para a subsistência. A falta de programas de capacitação suficientes para atender a demanda existente, alinhados às necessidades do setor produtivo e a falta de conscientização e motivação do público carente em relação à necessidade de qualificação, agrava essa questão.

Social
As disparidades sociais, a falta de acesso à educação de qualidade, saneamento básico e lazer, bem como a desestruturação familiar e a ausência de espaços de convivência comunitária suficientes para a demanda existente, criam um terreno fértil para a violência. A segregação social e a invisibilidade de certas comunidades dentro do próprio bairro podem gerar ressentimento e exclusão, impactando diretamente a segurança.

Políticas públicas e privadas

A ineficácia ou ausência de políticas públicas integradas em áreas como educação, saúde, cultura e urbanismo e suficientes, contribui para o problema. Da mesma forma, a falta de iniciativas do setor privado em responsabilidade social corporativa suficientes, investimento em comunidades carentes e parcerias com o poder público, limita o impacto positivo que poderia ser gerado.

O papel da elite empresarial: agentes de transformação

Como grupo da elite empresarial, a capacidade de influência e o capital social e financeiro são ferramentas poderosas para impulsionar a mudança. A atuação não deve se limitar à cobrança do poder público e a ações sociais insuficientes para a demanda existente,, mas sim se estender à cocriação de soluções.

O que podemos fazer?


1. Investir em mais Programas de Capacitação e Empregabilidade: Desenvolver e financiar mais programas de qualificação profissional que atendam às reais demandas do mercado local. Criar mais canais e plataformas de conexão entre empresas e talentos da comunidade, oferecendo oportunidades de primeiro emprego e reinserção no mercado de trabalho.

2. Fomentar a economia local e o empreendedorismo: Incentivar a criação de pequenos negócios e startups em Boa Viagem e nas comunidades vizinhas, por meio de mentorias, acesso a microcrédito e incubadoras. Isso gera renda, cria um senso de pertencimento e reduz a ociosidade.

3. Apoiar ainda mais as iniciativas sociais e comunitárias: Financiar e participar ativamente de projetos sociais focados em educação, esporte, cultura e lazer para crianças e jovens em situação de vulnerabilidade. Fortalecer associações de moradores e ONGs que atuam na base, promovendo a coesão social. Os empresários poderiam dedicar mais parte do seu tempo para essas ações participando de conselhos empreendedores e mentorias sociais.

4. Mais engajamento e colaboração com o poder público: Atuar como um interlocutor estratégico junto às autoridades, não apenas apresentando demandas, mas oferecendo dados, análises e propostas concretas. Estabelecer parcerias público-privadas para a implementação de projetos de segurança integrada, urbanismo tático e revitalização de espaços públicos.

5. Promover a conscientização e a participação cidadã: Utilizar a capacidade de comunicação e influência para educar a população sobre a importância da corresponsabilidade na segurança. Incentivar a denúncia anônima, a criação de redes de vizinhos e a participação ativa em conselhos comunitários de segurança.

A segurança em Boa Viagem e em outras áreas é um desafio complexo, mas não insolúvel. A união de esforços entre o setor empresarial, o poder público e a sociedade civil, com foco nas causas raízes do problema, é o caminho para construir um futuro mais seguro e próspero para todos. Além de divulgar o que se faz, é preciso fazer muito mais. O que se faz ainda não é suficiente.

Como você acredita que a iniciativa privada pode melhor se articular para garantir a sustentabilidade dessas ações a longo prazo?