O mugido da vaca - descoberta

Vladimir Souza Carvalho
Membro das Academias Sergipana e Itabaianense de Letras

Publicação: 12/07/2025 03:00

Não conheço a história de Adolfo Sax, inventor do saxofone. No entanto, estou certo que, inicialmente, o feliz inventor escolheu sons diferentes dos instrumentos já conhecidos – o saxofone foi um dos últimos –, a fim de dar maior ênfase a sua descoberta. Deu certo. Perto dos demais, é fácil distingui-lo. Até aí nenhuma novidade, a gente navegando em mares já conhecidos. Não sei se antes de mim algum curioso alevantou o problema. O meu conhecimento atinente à história do sax é bastante minúsculo. O fato que me leva a abrenhar na matéria é a certeza, ou quase certeza, de Adolfo Sax, na construção das notas graves, ter se inspirado no mugido da vaca, em busca do filhote, quando presa em curral, o chama com insistência, num repetitivo dóóóóó, que cansa quem ouve, sem cuidado de manter silêncio para não acordar, como acorda, quem, por perto, dorme. É som absolutamente igual ao dó do sax soprano, com ou sem sustenido. Afirmo na condição de operador, ainda na categoria de amador, do sax soprano. 

Eu ouvi, há pouco, em duas noites vividas em uma propriedade rural. O mugido da vaca me despertou. Ante sua reiteração, tive a atenção despertada para a semelhança com o dó grave do sax soprano, a língua do músico a expelir um sopro leve, suficiente para o som se apresentar, cagado e cuspido – escusas o leitor mais sisudo em não usar encarnado e esculpido  –, com o mugido da vaca, separada do filhote, buscando tê-lo ao seu lado, na impossibilidade de sair mato a dentro a sua procura. Está presa no curral, a separação ocorre para o filho não se utilizar do leite que o seu proprietário extrai da mãe a fim de vendê-lo, sem que a vaca seja consultada e participe de qualquer percentual. Depois de tirado o leite, o animal é levado ao encontro do filho, até que, no dia seguinte, a cena se repete, e a vaca volta a tocar sax soprano, e, mais ainda, sem o instrumento apropriado.   

Se a vaca falasse, em protesto, fecharia as torneiras das tetas para o leite não sair. A coitada só faz mugir, em instantes diversos, acordando quem dorme por perto. Foi o meu caso. No entanto, com a descoberta, agora tornada pública, espero sentado, porque em pé cansa, que eu possa ser aclamado como o autor da notável descoberta. Um prêmio Nobel, seria pedir muito?