Da caneta ao computador: como o Prontuário Eletrônico do Paciente salva vidas

Paulo Magnus
CEO da MV

Publicação: 05/08/2025 03:00

O Brasil é, hoje, o país que mais investe em tecnologia da informação em saúde na América Latina e concentra a maioria das decisões estratégicas sobre o Prontuário Eletrônico do Paciente (PEP) na região. Essa constatação, respaldada pelo instituto americano KLAS Research, me leva a uma reflexão profunda sobre como a tecnologia, em especial o PEP, tem sido um divisor de águas na transformação da saúde brasileira.

A transição do papel para o digital não é apenas uma evolução técnica: representa uma revolução cultural e de processos. É um caminho que o Brasil vem trilhando com pioneirismo, superando desafios e, sobretudo, amadurecendo sua visão sobre a importância estratégica da informação em saúde.

No início, a digitalização dos prontuários no Brasil era tímida e isolada — iniciativas pontuais, muitas vezes motivadas por lideranças visionárias ou por necessidades administrativas específicas. Lembro do meu próprio início nessa jornada, no Hospital Nossa Senhora dos Navegantes, em Torres, onde, com muito esforço, começamos digitalizando dados para melhorar o faturamento hospitalar. Naquela época, não havia diretrizes nacionais claras. O resultado? Sistemas fragmentados, incapazes de se comunicar.

A virada começou com o surgimento de marcos regulatórios e uma crescente consciência sobre o papel da tecnologia. Hoje, o Brasil se tornou referência em soluções digitais em saúde na América Latina. Isso nos enche de orgulho.

Mas ainda há muito a ser feito. Compartilho com emoção a trajetória que transformei em livro: da pequena Dom Pedro de Alcântara, no interior do Rio Grande do Sul, até a liderança da MV, hoje a maior healthtech da América Latina. Com 38 anos de história, a MV conquistou uma posição inédita: somos a 5ª maior fornecedora global de Prontuário Eletrônico do Paciente, segundo o relatório da KLAS Research de 2025 — ao lado de gigantes como Epic, Dedalus, InterSystems e Meditech.

O relatório reconheceu 894 hospitais que utilizam o SOUL MV em sua base de análise. No entanto, é importante destacar que a MV já ultrapassou a marca de 1.400 hospitais clientes em toda a América Latina, refletindo um alcance ainda mais amplo que vai além da amostragem registrada oficialmente até aqui.

Essa capilaridade é acompanhada de um movimento decisivo em direção à transformação digital. Hospitais de referência nacional, como o Hospital Moinhos de Vento, a Santa Casa de Porto Alegre e o Hospital Mãe de Deus, no Rio Grande do Sul, estão investindo fortemente em digitalização, integração de dados e inteligência clínica. Essas instituições simbolizam o avanço do Sul do Brasil rumo a um modelo de saúde mais moderno, conectado e centrado no paciente. 

Esse futuro já é realidade em países como Estônia, Israel e Dinamarca, onde a interoperabilidade trouxe ganhos expressivos em eficiência e cuidado. E o Brasil também tem seus exemplos de sucesso. As Unimeds de Sorocaba e Campos dos Goytacazes, com redução de até 25% de exames e 40% nas idas desnecessárias às emergências; o maior hospital privado do Norte e Nordeste, que vem construindo um modelo de saúde “sem portas”, baseado em atenção contínua e digital; e, no setor público, Belo Horizonte, que se destaca como a primeira capital brasileira a caminhar para um sistema 100% digital.

Essas experiências provam que a integração de dados promove um cuidado mais resolutivo, reduz custos e, acima de tudo, salva vidas. Com o paciente no centro, ganhamos em precisão, agilidade e humanização.

Então, o que falta para essa mudança se tornar realidade em escala nacional? Certamente não é a tecnologia — ela já está madura e disponível. O principal obstáculo está na falta de decisão por parte de muitos gestores, públicos e privados. Falta visão sistêmica, coragem para romper com modelos obsoletos e, principalmente, a compreensão de que saúde digital não é custo, é investimento. Digitalizar é conectar. É ampliar o acesso. É evitar desperdícios. É cuidar melhor.

Se quisermos um sistema de saúde menos burocrático, mais inteligente e verdadeiramente centrado nas pessoas, o momento de agir é agora. Carrego essa bandeira com convicção. Com os pés firmes no presente, inspirado pelo passado e movido por um propósito: fazer do futuro uma realidade possível.

Por isso afirmo, com ousadia e responsabilidade: a saúde no Brasil será plenamente digital nos próximos dez anos. Não se trata de um sonho distante. É um plano concreto. E, mais do que isso, é uma necessidade inadiável.