Sororidade contra assédio no ônibus Aplicativo criado por universitárias pretende gerar rede de informações sobre crimes nos coletivos

Mariana Fabrício
marianafabricio.pe@dabr.cm.br

Publicação: 10/09/2016 03:00

A UFPE tem 17,7 mil alunas, 1,2 mil professoras e 2,2 mil funcionárias. Para ajudar a combater casos de assédio nas 17 linhas de ônibus que servem ao campus, cinco universitárias da Federal pernambucana, da UFRPE e do Instituto Federal da Paraíba (IFPB) criaram um aplicativo para colher relatos e facilitar denúncias. O Nina, que começa a operar no fim deste mês, busca criar uma rede de colaboração pelo celular, evitando a subnotificação e dando voz às vítimas, seguindo o conceito de sororidade. A plataforma vai reunir dados que serão entregues ao poder público. “No estado não há registro de quantas mulheres sofrem assédio nos ônibus ou em qual horário isso se intensifica. Nosso objetivo é ajudar a levantar esses dados, promovendo uma sororidade tecnológica”, explica a estudante de design gráfico do IFPB Simony César, que desenvolveu o app com as colegas Cássia Oliveira, Jucylene Melo, Nicolle Cysneiros e Simone Amorim.

O relato será enviado a um banco de dados pelo qual os casos serão mapeados. As denúncias podem ser realizadas de maneira anônima, mas ao instalar é necessário fazer login e ativar a geolocalização. “Nosso objetivo é ampliar o uso para alcançar a Região Metropolitana. Com o app consolidado e feedback dos usuários, estudaremos melhor a distribuição por geolocalização”, conta.

Uma das maiores dificuldades do projeto é a falta de recursos, já que as estudantes arcam com todos os custos. A ideia surgiu em maio, quando Simony participou do desafio de tecnologia Hackacity, que propõe soluções aos problemas da cidade.

Disponível inicialmente na Play Store (Android), o aplicativo poderá ser usado por quem presencia o crime ou sofre o assédio. É possível fazer fotos e vídeos de até 15 segundos e uma janela de comunicação permite que as usuárias troquem informações. A plataforma servirá para ajudar na identificação dos agressores. Imagens ficarão disponíveis para as usuárias, tornando mais fácil o reconhecimento. O nome homenageia a cantora norte-americana Nina Simone, lembrada pela luta contra a violência de gênero.

“Tanto no espaço doméstico como no público existem formas simbólicas de violar o corpo da mulher. São chamadas de cantadas, mas que agridem e invadem. Diante das próprias circunstâncias, muitas vezes se torna inviável fazer um registro do que acontece”, considera a pesquisadora do Instituto SOS Corpo, Verônica Ferreira. Para a diretora geral de enfrentamento à violência de gênero da Secretaria Estadual da Mulher, Bianca Rocha, a ideia pode estimular mais mulheres a utilizar ferramentas para denúncia. “Iniciativas como essas ajudam a levantar dados empíricos sobre esse tipo de violência nos coletivos”, conta. O órgão conta com a Ouvidoria das Mulheres, através do 0800.281.8187. Segundo a delegada Marta Rosana, da Delegacia da Mulher, os assédios que acontecem em locais públicos são considerados contravenções penais e podem ser punidas com multas.  

Usada no teste da plataforma, a UFPE registrou de janeiro a agosto apenas uma denúncia de assédio formalizada. Isso significa que a minoria das vítimas relata o caso, por medo ou constrangimento. Alunas e funcionárias podem denunciar à Ouvidoria, ao site da instituição ou à Central de Operações. Para inibir crimes serão instaladas 230 novas câmeras no Campus e 11 nas paradas, com transmissão para a Polícia Federal e Ciods. A próxima atualização do aplicativo UFPE Mobile trará uma aba para facilitar as denúncias.