Para deixar de ser invisível No Dia da visibilidade trans, celebrado neste domingo, documentário traz reflexão sobre formas de preconceito

Publicação: 28/01/2017 03:00

Curta produzido por Dandara e Lucas foi estrelado por Verônica (PEU RICARDO/ESP.DP)
Curta produzido por Dandara e Lucas foi estrelado por Verônica
As imagens podem soar fortes para algumas pessoas. Mas Lascívia retrata com fidelidade a realidade vivida pelas mulheres transexuais e pelas travestis em todo país. O curta, produzido e encenado por estudantes da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), denuncia o assédio sexual, estupro e assassinato sofridos por essa população todos os dias. O material, produzido para servir de reflexão no Dia da visibilidade trans, celebrado neste domingo, lembra que o Brasil é o país onde mais se mata travestis e transexuais no mundo, segundo a ONG Transgender Europe, da rede europeia de organizações que apoiam os direitos da população transgênero.

O curta é uma produção da estudante de ciências sociais Dandara Luisa Alves, uma mulher trans, e do estudante de jornalismo Lucas Xavier de Oliveira. Há dois anos Dandara, hoje com 23, se assumiu mulher. Aconteceu depois de um longo e doloroso processo de aceitação. Passou, então, a sofrer um tipo de assédio diferente quando sai às ruas. “Não é comum que tentem me deslegitimar por ser mulher, mas que me assediem por achar que sou fácil. E aí, gostosa, tá a fim? É o que costumo escutar. É aquele corpo que parece ser tão acessível que não precisa de permissão. No imaginário geral da sociedade, a mulher trans está à disposição dos homens para lhe darem prazer. Isso é um sintoma, um reflexo. Noventa por cento das mulheres trans no Brasil, hoje, estão na prostituição porque não possuem outros meios de sobrevivência”, denuncia.

Dandara usou a própria experiência de assédio sexual para unir-se a Lucas e criar o roteiro do curta, uma ficção. O filme conta a história de uma mulher trans, Madalena (vivida pela atriz e mulher trans Verônica Valente), e sua dor diante de um estupro praticado por Edmilson (interpretado pelo ator e estudante universitário Silas Veloso). A narração em off é da própria Dandara, com base em um texto preparado por ela e divulgado nas redes sociais. “Meu corpo não menstrua, porém, meu sangue escorre todos os dias. Meu sangue é derramado quando ainda nem me resta a sarjeta. Durante o tempo em que, ao assumir a minha real identidade, fui instantaneamente marginalizada e empurrada para a prostituição, se tornando a única saída para a minha sobrevivência. Porém, acabo sangrando, sobretudo, na ocasião em que até a morte me é negada por essa sociedade, pois até assim sou ridicularizada e culpada por chegar até aqui e ser assassinada”.

O curta será exibido durante um evento preparado pelos estudantes junto à Diretoria LGBT da UFPE, na próxima terça-feira, a partir das 18h, no Centro de Artes e Comunicação da UFPE. Também haverá performance musical de Cris Oliveira, pessoa trans, além de um debate com participação de Fabiana Melo, mulher trans e assessora parlamentar na Assembleia Legislativa de Pernambuco; Bernardo Cruz, homem trans e militante da causa LGBT; e Geovana Borges, técnica administrativa da diretoria LGBT e mulher trans.

A Secretaria de Defesa Social não divulga números de violência contra essa população porque alega que são subnotificados. Já o Centro Estadual de Combate à Homofobia também não contabiliza esses dados. Dos serviços oferecidos pelo centro, cerca de 25% são demandados por pessoas trans, ou seja, das 234 pessoas atendidas no ano passado, 64 se identificam e se reconhecem como trans.