Amor conquistado com as bênçãos de Zé Pereira

Publicação: 18/02/2017 09:00

Ilanna e Nelson se casarão em 27 de janeiro de 2018, perto de um novo carnaval (Vanessa Dias/Divulgacao)
Ilanna e Nelson se casarão em 27 de janeiro de 2018, perto de um novo carnaval

A data do casamento dos administradores de empresa Ilanna Souza, 26, e Nelson Fortes, 30, está marcada para 27 de janeiro do próximo ano. A lista de músicas que vão tocar na cerimônia e na festa ainda não foi definida, mas de uma coisa eles têm certeza. Haverá frevo e samba. “Devemos isso a Zé Pereira”, enfatizou a noiva. Foi em um sábado de carnaval que o casal se conheceu. No sobe e desce das ladeiras de Olinda, ficaram pela primeira vez e o que era uma paquera de carnaval se tornou namoro, noivado e vai virar casamento.

Antes de firmar o relacionamento sério, porém, o casal enfrentou desafios e desencontros. “Depois de um tempo juntos naquele carnaval em que nos conhecemos, eu disse que queria ir ao banheiro. Quando retorno, ele não estava mais. Ele tinha pensado que meu pedido de ir ao banheiro era uma tentativa de sair da situação. E ao perceber que ele não estava mais lá quando voltei, interpretei da mesma forma”, contou Ilanna. “No dia seguinte, liguei para ela e esclareci o mal-entendido. Pronto. Não nos desgrudamos mais e estamos indo para o quarto carnaval juntos. Só que o deste ano tem um gostinho diferente. Será o último com nomes diferentes, já que no próximo estaremos casados”, lembrou Nelson.

Mesmo sem estarem no carnaval pelo clima de paquera, os administradores não deixam de cair na folia. “Já pensamos em viajar nesse período da festa para aproveitar os dias de folga, mas não conseguimos nos imaginar em outro lugar nessa época que não seja Olinda ou Recife”, disse Nelson. “Acho que a última coisa que nós dois pensamos quando estávamos brincando carnaval em 2014 foi esse encontro que tivemos. Fui criada em Olinda, passei todos os meus carnavais nas ladeiras, mas achar um marido nunca foi minha primeira ideia sobre a festa. Continuaremos brincando sempre. Agora, juntos”, completou Ilanna.

Sobre o que mais gosta no carnaval, a noiva disse que adora as cores da folia, curte pensar nas fantasias que vai usar e as marchinhas.

Sem consentimento, a brincadeira perde a graça

As regras da paquera no carnaval mudaram bastante nas últimas décadas. Se beijar à força, puxar o cabelo, passar a mão e outras investidas sem consentimento eram consideradas normais, hoje já não podem fazer parte da folia. A legislação brasileira não vê essas práticas como uma brincadeira. O artigo 213 do Código Penal prevê reclusão de 6 a 10 anos para quem “constranger alguém mediante violência ou ameaça a ter conjunção carnal ou a praticar outro ato libidinoso.”

O historiador Thiago Mondenesi, professor do Centro Universitário FG, explica que a mudança de comportamento acompanha as transformações da sociedade. “Houve o empoderamento feminino e isso reflete no carnaval”, afirmou. Segundo o pesquisador, antes de serem assimilados pelos foliões, os direitos surgem como reivindicação social, tornam-se leis e só então passam a fazer parte do comportamento. “O carnaval de Pernambuco se caracteriza por ser da rua, do povo. Assim, absorve não só problemas, mas também avanços sociais”, pontuou.

Quando surgem, as mudanças geram debate, polêmica e, por vezes, resistência. “No entanto, o debate gera uma sociedade mais viva e antenada. Permitir que o beijar à força faça parte da festa prejudicaria o carnaval enquanto instituição de lazer. As discussões e as mudanças tâm que incomodar mesmo”, ressaltou.

Para a jornalista e fundadora do Grêmio Anárquico Feminístico Essa Fada, Geisa Agrício, apesar das mudanças na legislação e dos avanços sociais, os assediadores continuam com os mesmos comportamentos. Por outro lado, as mulheres aceitam menos, denunciam mais, se unem e se protegem mais.

“O comportamento feminino ainda é julgado e as vítimas são culpabilizadas pelo assédio. O bloco da gente surgiu para discutir que carnaval é lugar de mulher sim, que liberdade sexual é para a mulher e ela tem escolhas”, afirmou, em resposta aos dados de uma pesquisa de 2016 do Instituto Data Popular cujos resultados mostraram que, para 61% dos homens, mulher solteira no carnaval não pode reclamar de ser cantada; 49% afirmaram que bloco não é lugar para mulher “direita” e 56% responderam que mulheres que usam aplicativos de relacionamento não querem nada sério.