Ritual macabro descrito em detalhes Durante júri, promotor explicou como os "canibais de Garanhuns" matavam suas vítimas. Sentença deve sair hoje

Publicação: 15/12/2018 09:00

O segundo júri popular dos “canibais de Garanhuns” poderá ser concluído neste sábado, no Fórum Rodolfo Aureliano, na Ilha Joana Bezerra. Ontem, a sessão foi encerrada às 20h30 com a fala do promotor do Ministério Público de Pernambuco (MPPE), André Rabelo, e do assistente de acusação Cláudio Cumaru, contratado pela família de Gisele Helena da Silva, umas das vítimas. O julgamento deve ser retomado neste sábado, às 9h, com a defesa dos três réus. Cada um dos três advogados terá uma hora para se pronunciar.

Jorge Beltrão Negromonte da Silveira, Isabel Cristina Pires da Silveira e Bruna Cristina Oliveira da Silva estão sendo julgados por matar Alexandra da Silva Falcão, 20, e Gisele Helena da Silva, 31, em Garanhuns, em 2012, e usar a carne das vítimas para fazer coxinhas e empadas que foram vendidas na cidade. Os réus respondem por duplo homicídio triplamente qualificado (motivo torpe, com emprego de cruel e impossibilidade de defesa), ocultação e vilipêndio de cadáver, e furto qualificado. Jorge e Bruna também são acusados de estelionato.

André Rabelo falou por duas horas. Cumaru se pronunciou por uma hora. Rabelo apresentou ao júri o laudo feito pelo psiquiatra do Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico (HCTP), Lamartine Holanda, que não constatou doença mental. “O que eles têm é transtorno de personalidade, diferente de doente mental. O que tem aqui é uma seita”, disse.

Rabelo disse que a seita tinha como objetivo o controle da natalidade. O trio escolhia mulheres com mais de um filho, sem marido e que procuravam amparo na religião, e que eram consideradas “impuras” por eles. Isabel, disse o promotor, era a responsável por selecionar as vítimas. “Depois a mulher era sacrificada embaixo do chuveiro, com faca peixeira, através de um corte na jugular, como um animal, e se debatia até morrer. Segundo Jorge, na cabeça está o cérebro, a razão. Depois, eles arrancavam pés e mãos, onde estariam as impurezas. O coração é o órgão do sentimento e não serve para ser usado, mas o fígado podia ser consumido porque é órgão que filtra o sangue”, disse.

A seita consistia em purificar a carne e o espírito das vítimas, que deviam ser quatro por ano. O promotor lembrou que os acusados também roubavam as mulheres e faziam compras com seus cartões. “Tenho 2,4 mil júris e nunca vi um crime tão macabro. Matar para esquartejar, comer, guardar na geladeira e, o mais escabroso, na presença de uma criança, filha de moça de 17 anos morta pelos três em Olinda”, disse o promotor. Ele se referiu a Jéssica Lima, morta em Olinda em 2008. Por esse crime Jorge pegou 23 anos e as mulheres 20 anos cada.

Ontem, Jorge afirmou que parte do livro escrito por ele – uma espécie de guia da seita denominada Cartel - foi ditado por Bruna. “Ela se dizia bruxa e falava que deveria matar quatro galinhas que representavam os quatro elementos da natureza. Só não poderia matar uma pessoa, porque se não teria que matar mais quatro para purificar seus espíritos”, explicou Jorge.

Ele disse que não estava em casa quando Alexandra e Gisele foram mortas e afirmou desconhecer o canibalismo, afirmando ser vegetariano. Para ele, Bruna articulou tudo e controlava os seis medicamentos dos quais ele dependeria para não surtar. O réu disse, repetidamente, que tem esquizofrenia e que Bruna o controlava. Jorge insistiu que as confissões que fez na delegacia foram sob tortura e em meio a um surto de esquizofrenia.

De acordo com o acusado, Bruna queria ter um filho com ele, mas como ela tinha problemas de saúde que o impediam, ela se aproximava de mulheres que já tinham filhos. Jorge foi casado com Isabel de 1984 a 2012, quando se divorciaram, mas continuaram morando na mesma casa que ela, inclusive enquanto namorava Bruna. Ele disse nutrir por Isabel um amor fraterno. “Ela é uma mulher frágil, uma pessoa amável que nunca teve participação”, alegou.

A defesa de Jorge pedirá que o réu seja internado no Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico (HCTP). A defesa de Isabel pede absolvição da ré. De acordo com os advogados, laudos comprovam que ela é incapaz de responder por seus atos. “Ela não tem participação nos dois homicídios ocorridos em Garanhuns. Temos documentos que comprovam que ela não estava presente no homicídio das duas vítimas”, disse o advogado Renato Vilela.

A defesa de Bruna argumenta que ela não teve condições psicológicas e físicas de tentar impedir as ações de Jorge. “Nossa tese irá afastar a culpabilidade dela e atinge exclusivamente Jorge. Ele é o mentor, mandante e executor dos crimes”, afirmou o defensor Rômulo Lyra.