Peritos apontam redução de autonomia Portaria divulgada pela Secretaria de Defesa Social no início deste mês prevê mudanças no procedimento de investigadores em locais de crime

Publicação: 15/04/2024 03:00

Uma portaria da Secretaria de Defesa Social (SDS), publicada no Boletim Geral da pasta, no início deste mês, altera a dinâmica de trabalhos investigativos envolvendo delegados e peritos criminais. Isso porque, a normativa de nº 2250, assinada pelo secretário da SDS, Alessandro Carvalho, prevê mudanças sobre o rito profissional de investigadores durante os procedimentos realizados em locais de crime e entre outros cenários de investigação policial.

A principal alteração está no art. 7º, parágrafo I, que diz que: “O perito criminal terá que informará à autoridade policial quais os objetos ou elementos que possam ter relação com o crime supostamente cometido ou com seu autor, sem prejuízo ao disposto no artigo anterior [..]”.

E no parágrafo II, no dispositivo a), diz que: “a autoridade policial requererá a arrecadação dos vestígios que poderão, segundo o perito policial, contribuir para a evidenciação da materialidade delitiva [..]”.

Segundo a Associação de Polícia Científica de Pernambuco (Apoc), o perito criminal perde a autonomia técnica e científica ao depender de uma autorização formal de um delegado para poder coletar provas e vestígios para o trabalho pericial dos profissionais.

Além disso, ficará à cargo da autoridade policial apontar quais os objetos e vestígios em que o perito deverá coletar para o trabalho de perícia, assim, prejudicando o trabalho autônomo dos profissionais do Instituto de Criminalística (IC).

A Apoc emitiu uma nota em que repudiou as mudanças realizadas pela SDS.

Segundo o documento enviado ao Diario de Pernambuco, a Associação convive com essa possibilidade há um bom tempo. “Já há mais de vinte anos, a Associação de Polícia Científica vem denunciando à mídia e à população as tentativas de subordinação da perícia oficial à chefia da Polícia Civil. Esse modelo de subordinação remonta à época da ditadura militar e já foi superado em Pernambuco há 50 anos. Contudo, as normas e leis que são emitidas tentam frequentemente fazer com que esse modelo retroaja a esse período”.

Ainda segundo a nota, assinada pela presidente da entidade, Camila Reis, diz que: “Aqui em Pernambuco a gente já teve a tentativa de emissão de lei orgânica da Polícia Civil com essa subordinação é essa portaria de local de crime e cadeia custódia que acabou de ser publicada pela Secretaria de Defesa Social (SDS) confirma essa tentativa de subordinação quando diz que o delegado de polícia deve determinar a arrecadação dos vestígios”.

Além disso, na normativa publicada pela SDS, em diversos parágrafos, é utilizado a nomenclatura Perito Policial, o que, segundo a Apoc, é usado de forma inconstitucional perante ao Código de Processo Penal (CPP) e a Constituição Federal.

A presidente da Apoc, Camila Reis, as medidas trazem prejuízos ao trabalho investigativo e pericial. “O perito precisa ter uma atuação isenta, sem que haja uma interferência da investigação. Isso porque, a investigação trabalha com provas testemunhais. Quando o perito vai analisar a coleta de vestígios para produzir a prova, ele não terá já uma teoria pré-estabelecida que possa comprometer a idoneidade do trabalho. Ele tem que ser imparcial. Ele tem que analisar o vestígio, o local, coletar as provas, e daquela análise do local em que ele vai fazer sem saber quais são as teorias da investigação para poder dizer: ‘Olhe, a prova diz isso, a prova diz aquilo, a prova mostra isso’, para que você tenha uma imparcialidade no processo. Apesar da gente ter a autonomia, sempre há uma norma, uma portaria, que faz com o que o perito responda ao delegado de polícia”, reclamou.

Ainda segundo ela, com as mudanças previstas,, o trabalho investigativo será prejudicado, pois não haverá o número suficiente de delegados para suprir todas as demandas. “Não terá delegado para estar em todos os locais. Isso não é um problema dos profissionais, e sim do Estado. E aí como eles não conseguem ir até o local, como é que irão conseguir estar nos locais de crime ao mesmo tempo para determinar que o perito colete os vestígios a serem periciados?”