Clima deve gerar corrida contra o tempo Um estudo divulgado recentemente mostrou que no estado, em comparação com outras épocas, as mudanças estão mais aceleradas

LARISSA AGUIAR

Publicação: 21/07/2025 03:00

A conservação da caatinga é um dos caminhos recomendados (TARCISO AUGUSTO/SEMAS)
A conservação da caatinga é um dos caminhos recomendados

Um estudo científico divulgado pelo Programa de Pós-Graduação em Rede Nacional para o Ensino das Ciências Ambientais (ProfCiAmb), com participação da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), lança um alerta contundente sobre os riscos futuros das mudanças climáticas no Nordeste brasileiro, com recorte específico para Pernambuco. A pesquisa se apoia na paleoclimatologia (ciência que investiga os climas antigos) para evidenciar como os ciclos naturais de variação climática, antes seculares, têm sido acelerados pelas ações humanas, com potencial para agravar desigualdades sociais e comprometer a segurança hídrica e alimentar da região.

O estudo recupera registros geológicos que indicam como as variações no clima moldaram, ao longo de milênios, o relevo, os biomas e os solos do Nordeste. Contudo, os pesquisadores alertam que, atualmente, o agravamento das mudanças por fatores antrópicos (como a queima de combustíveis fósseis e o desmatamento) está acelerando a ocorrência de eventos extremos como secas severas, chuvas torrenciais e aumento de temperaturas. Em Pernambuco, essas alterações já se manifestam de forma concreta, especialmente no Sertão e no Agreste.

“Ao observarmos os dados meteorológicos das últimas décadas, notamos uma tendência de redução das chuvas e aumento da variabilidade nos padrões de precipitação. As chuvas ocorrem fora de época ou com intensidade incomum, alternando entre estiagens prolongadas e alagamentos súbitos”, explica o professor Lucivânio Jatobá, da UFPE. Ele é um dos autores do trabalho publicado na Revista Ciência Geográfica, da AGB-Bauru, e destaca que as populações mais vulneráveis são também as mais impactadas.

Na Zona da Mata, onde predominam morros e encostas, o aumento da temperatura do Atlântico tem favorecido chuvas intensas no fim do outono e no inverno, causando deslizamentos e enchentes em áreas de ocupação precária, como se observa em parte da Região Metropolitana do Recife. Já no interior, a irregularidade das chuvas compromete a produção agrícola de base familiar e agrava a insegurança hídrica, mesmo em áreas historicamente adaptadas à seca.

A pesquisa destaca ainda que o Semiárido nordestino, embora já acostumado com secas milenares ligadas à atividade solar, pode experimentar novos padrões de estiagem agravados pela interferência humana no sistema climático. A intensificação desses eventos compromete a produção de alimentos e a disponibilidade de água, com impactos diretos sobre agricultores familiares, comunidades ribeirinhas e populações urbanas periféricas.

ALAGAMENTOS
No litoral pernambucano, os efeitos do aquecimento global se manifestam através da elevação do nível do mar, que ameaça cidades como Recife e Olinda. A intensificação das chamadas “Ondas de Leste”, somada à falta de infraestrutura urbana adequada, tende a aumentar a frequência de inundações e alagamentos em bairros populares. O estudo também analisa mudanças globais em sistemas como o Jet Stream, corrente de ar de alta altitude que influencia padrões climáticos em diversas partes do planeta. 

Apesar de atuar com maior força no Hemisfério Norte, suas oscilações têm repercussões indiretas no clima do Nordeste brasileiro, interferindo na distribuição das chuvas e intensificando períodos de seca ou tempestades. Para o professor Jatobá, compreender os registros climáticos do passado é essencial para formular estratégias de adaptação. “As lições geológicas nos mostram que o clima sempre oscilou, mas nunca com a rapidez e intensidade de agora. Precisamos integrar esse conhecimento à formulação de políticas públicas eficazes, que considerem as especificidades de cada região”, afirma.

Entre as recomendações do estudo estão a redução das emissões de gases de efeito estufa, a conservação de florestas nativas, como a Caatinga, extremamente sensível às alterações climáticas, e o incentivo a práticas agrícolas sustentáveis, como os Sistemas Agroflorestais (SAFs), que já vêm sendo aplicados no Agreste e Sertão de Pernambuco. “O maior desafio não é apenas ambiental ou tecnológico. Ele é também político e social. Precisamos agir com base na ciência e com urgência. O tempo para evitar danos irreversíveis está se esgotando”, conclui o relatório.