Estado é condenado por carro baleado Uma mulher teve seu carro alvejado 40 vezes após se negar parar o veículo durante uma abordagem feita à noite no meio da BR-101

JORGE COSME

Publicação: 17/07/2025 03:00

A Justiça concordou com a "culpa concorrente" e reduzir o valor da indenização (DIVULGAÇÃO/TJPE)
A Justiça concordou com a "culpa concorrente" e reduzir o valor da indenização

A 3ª Vara da Fazenda Pública da Capital, do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE), condenou o Estado de Pernambuco a indenizar uma mulher que teve o carro baleado mais de 40 vezes ao desobedecer ordem de parada da Polícia Militar (PM) em Abreu e Lima, no Grande Recife. O Estado deverá pagar R$ 50 mil de danos morais e R$ 26 mil de danos materiais à paraibana Erika Batista Soares.

Nos autos, a vítima relata que voltava do Recife para João Pessoa, na Paraíba, acompanhada de sua mãe, na madrugada de 10 de setembro de 2019. Durante o trajeto pela BR-101, foi abordada por um carro em movimento e teria ouvido uma voz agressiva dos PMs Diego Luis Silva Tenório e Fernando Lopes Veloso, exigindo que parassem. “Estava claro que não se tratava de uma abordagem policial, pois um policial não faria este tipo de abordagem em uma BR em plena madrugada”, escreve a advogada de Érika, Edilza Batista, na petição inicial.

Segundo a advogada, Érika não conseguiu identificar que se tratava de uma viatura policial, devido à abordagem intimidadora e por não ouvir ou avistar sinais sonoros e luminosos. Ao emparelharem os carros, os policiais teriam começado a atirar diversas vezes contra o veículo da mulher.

“Quando o carro chegou na Polícia Rodoviária Federal de Igarassu (PE) a promovente [Érika] parou o veículo e os policiais militares do Estado de Pernambuco Diego Luis Silva Tenório e Fernando Lopes Veloso continuaram atirando contra o veículo”, acrescenta a advogada. Os disparos só teriam parado quando a mulher desceu do carro e disse que não era criminosa. Segundo ela, os policiais disseram ter efetuado mais de 40 tiros de arma de fogo. Eles teriam alegado que pensaram se tratar de um carro envolvido em um assalto a banco no Recife.

No processo, Érika relata que o episódio resultou em sequelas psicológicas, não dirige mais à noite e está com depressão. O Estado, em sua contestação, reforçou que a ação policial de disparar contra o veículo decorreu da mulher não atender a ordem de parada. “Ao contrário do alegado, não houve disparos visando o corpo das ocupantes, tanto é que nenhuma se feriu”, declarou.

“Não havendo atitude comissiva ou omissiva contrária ao direito, sem falhas na prestação do serviço, atuando com diligência a autoridade pública, sem cometer excessos, fica afastada qualquer responsabilidade de indenizar”, acrescentou o Estado.

Na sentença, assinada em 1º de julho deste ano, a juíza Milena Flores Ferraz Cintra conclui que a conduta dos policiais foi desproporcional e excessiva. “As provas dos autos, em especial o Laudo Pericial e o Inquérito Policial, demonstram que foram efetuados múltiplos disparos de arma de fogo. Tal reação, diante de uma mera desobediência à ordem de parada em uma rodovia, extrapola os limites do razoável e do exercício regular de um direito, criando um risco inaceitável à vida da autora e de sua genitora”.

No entanto, ela concordou com a tese da defesa de culpa concorrente. “É inegável que a atitude inicial da autora, ao não atender à ordem de parada e empreender fuga, contribuiu para a escalada dos acontecimentos”, disse. O reconhecimento da culpa concorrente resultou na redução do valor da indenização. Em nota, a Procuradoria Geral do Estado de Pernambuco informou que está analisando o caso para decidir sobre eventuais recursos.