Poesia para os ouvidos Audiolivro Brasil dizendo Drummond volta ao mercado. Agora, pode ser escutado diretamente do celular

REBECA OLIVEIRA
edviver.pe@dabr.com.br

Publicação: 21/06/2015 03:00

“Há máquinas terrivelmente complicadas para as necessidades mais simples”, lamentava Carlos Drummond de Andrade no poema O sobrevivente. Àquela altura, em 1930, o poeta considera impossível compor uma nova obra diante da evolução tecnológica da humanidade. Um dos males que à época o assombrava, hoje ajuda a difundir a obra do poeta mineiro. Na semana passada, foi relançado o audiolivro Brasil dizendo Drummond, no Ubook primeiro serviço de assinatura que oferece audiolivros via streaming no país.

“A própria qualidade da obra de autores brasileiros assegura sua durabilidade, mas, é claro, é sempre bom adaptá-las a novos meios de comunicação e de distribuição. É válido e gratificante”, analisa o neto Pedro Drummond em entrevista ao Correio/Diario. “Ser o guardião da obra do meu avô não é um peso. Procuro difundi-la onde normalmente não costumamos vê-la. Por isso, decidimos fazer a distribuição nos meios digitais. É uma forma de matar a saudade dele”, emociona- se o caçula dos três netos do poeta, responsável pelo legado.

Pedro Drummond anunciou outras novidades “drummondianas” prestes a sair do forno nos próximos meses: “Paulinho Lima e eu estamos com um projeto para 2017, uma nova edição de gravações: Reunião - O mundo dizendo Drummond, com poemas em português e recitados em outros idiomas por personalidades de vários países”, adianta. Antes, pretende publicar a coletânea Lanterna mágica - Retrolâmpago de amor visual, livro que destacará a relação de verso e prosa do poeta mineiro sobre o cinema.

Os projetos se apoiam na possibilidade de crescimento do mercado de audiolivros - há quem acredite que deve ocupar o lugar reservado aos e-books. Aplicativos e telefonia móvel ajudam na popularização do formato que, ao contrário do que pregavamos mais catastróficos, não veio para acabar com os livros impressos, mas estender o acesso a literatura. “Acredito que esse crescimento acompanha a falta de tempo das pessoas em pararem para ler o livro. Agora, podem ouvi-lo onde estiverem”, pontua.

Os números ajudam a reiterar a visão de que os audiolivros não estão mais restritos a deficientes visuais, propósito inicial do formato que explodiu na década de 1990. Nos Estados Unidos, esse mercado rendeu US$ 1,3 bilhão em 2013. Entre 2010 e 2011, os livros para ouvir tiveram crescimento de 30%, contra 8% dos livros digitais. Eduardo Albano, sócio da Ubook, que aposta no formato e no projeto em homenagem ao poeta, endossa o pensamento.

“O valor da obra de Drummond não está no papel. Está no conteúdo. Com a vida caótica nas cidades, as pessoas podem ouvir os versos dirigindo, na academia, no transporte público…”, avalia, orgulhando-se da obra que passa a compor o catálogo assinado por 500 mil pessoas. O serviço custa R$ 18,99 ao mês e está disponível para Android, iOs e web

Três novidades entreos audiolivros

Depois de Auschwitz, de Ema Eva Schloss
O relato da irmã de Anne Frank, Eva, enviada ao Holocausto aos 15 anos, está disponível no site tocalivros.com por R$ 21,90. A plataforma também funciona como aplicativo para Android e iOs, mas, diferente do Ubook, não cobra uma assinatura mensal, vendendo cada obra por um preço individual.

A hora da estrela,
de Clarice Lispector

Com vozes de Maria Bethânia e Pedro Paulo Rangel, passa a integrar o catálogo da Ubook a partir dessa semana junto a boa parte da obra da ucraniana radicada no Brasil.

Game of thrones,
de George RR Martin

O aplicativo de audiolivros Audible, da Apple, passou a ganhar o suporte CarPlay, uma interface especial para motoristas que otimiza o acesso a livros no trânsito. As obras, agora, ficam disponíveis pela interface do computador de bordo e a biblioteca sincroniza-se automaticamente ao app do carro. Game Of Thrones, de George RR Martin, é um dos títulos disponíveis no catálogo. O serviço custa US$ 14, 95 por mês. 

De Othon Bastos a Chico Buarque

O audiolivro Brasil dizendo Drummond chegou ao mercado brasileiro inicialmente em 2002, quando o poeta completaria 100 anos. Com narrações de Othon Bastos, Chico Buarque, Paulo Autran, Aracy Balabanian, Odete Lara e outros 142 nomes, entre artistas e desconhecidos, foi considerado um clássico e uma das mais belas homenagens recebidas na ocasião, fora a estátua na praia de Copacabana. No entanto, os versos foram distribuídos em quatro CDs, objeto que, devido à evolução tecnológica, tornou-se quase obsoleto para algumas pessoas - sobretudo o público hiperconectado nascido na geração Y.

Os direitos de Brasil dizendo Drummond foram cedidos à Ubook pela editora Luz da Cidade, de Paulinho Lima, que, para fazer a primeira edição, passou por quatro capitais - Rio de Janeiro, São Paulo, Salvador e Belo Horizonte -, gravando as leituras, feitas por personalidades e anônimos. Foram meses de gravação e Paulinho foi um dos pioneiros a investir no segmento.
Ainda hoje guarda boas recordações. “Paulo Autran, Tônia Carrero, Antônio Cícero, os mais entusiasmados com poesia, foram os primeiros a participar. Alguns foram convidados, outros, ao saberem do projeto, se ofereceram para declamar”, recorda-se.