Uma série na berlinda
Cineastas e historiadora questionam a linha adotada pelo diretor José Padilha na série O mecanismo. Produção é um embate entre realidade e ficção
Cecília Emiliana
DO ESTADO DE MINAS
Publicação: 02/04/2018 09:00
“Sabe um cancro? Se a gente não matar isso agora, pela raiz, essa porra vai espalhar”, adverte Marco Ruffo, agente da “Polícia Federativa” vivido por Selton Mello na série O mecanismo, dirigida por José Padilha e inspirada na Operação Lava-Jato. Produção original da Netflix, a atração estreou no dia 23 em meio a um “tiroteio” de polêmicas. As “balas” vêm de quase todo lados: de artistas a políticos, passando por militantes de esquerda, que acusam o cineasta de “crimes” variados, como abuso de licença poética e “assassinato de reputação”.
Grande parte da celeuma se deve à cena em que a frase “estancar a sangria” sai da boca de João Higino, personagem inspirado no ex-presidente Lula. Na vida real, a afirmação foi feita pelo senador Romero Jucá (MDB-RR). Um dos principais articuladores do impeachment, o político pernambucano radicado em Roraima se referia à necessidade de pôr um freio às ações da Lava-Jato.
Lançada neste ano eleitoral, em meio à intensa polarização política e guerra nas redes sociais, a produção despertou a ira da ex-presidente Dilma Rousseff. Ela acusou: “A série O mecanismo é mentirosa e dissimulada. O diretor inventa fatos. Não reproduz ‘fake news’. Ele próprio tornou-se um criador de notícias falsas.”
Lula afirmou que pretende processar a Netflix. Ele teria proferido a ameaça em passagem por Curitiba. “Nós vamos processar a Netflix, nós não temos que aceitar isso. Eu não vou aceitar (...) Eles produziram uma peça que é mais uma mentira”, acusou.
Sobrou para a Netflix, alvo de uma campanha de boicote a seus serviços. “A alternativa ao boicote seria o silêncio e essa não é uma opção pra mim”, diz o crítico de cinema Pablo Villaça, um dos líderes do embate com a empresa de streaming. “O problema, do meu ponto de vista, não é que um cineasta seja de direita nem as crenças políticas do Padilha. Ele tem todo o direito de se posicionar como quiser, é legítimo. Mas a estratégia narrativa desta série chega a ser mau caráter. Os fatos históricos ali foram muito deturpados. Colocar a frase do Jucá na boca do Lula é de uma má fé incrível”, afirma o mineiro, que tem 230 mil seguidores no Twitter.
Villaça diz que o lançamento de O mecanismo não foi o único motivo que o levou a interromper sua assinatura da Netflix. Explicou que se trata de um processo de desgaste que inclui fatores éticos, políticos e artísticos. “A empresa é muito eficaz em suas propagandas e em se pintar como uma corporação cool, que ama o audiovisual e a ética. Infelizmente, assim como ocorreu com o Facebook – que seguia o mesmo caminho, ao afirmar querer apenas aproximar as pessoas e se revelou uma plataforma de intolerância que passava os dados confidenciais de seus usuários a outras empresas. O serviço de streaming foi permitindo que víssemos outras facetas que tornavam difícil comprar o seu discurso”, argumenta. A Netflix não se pronunciou sobre cancelamentos e possíveis prejuízos causados pelo boicote.
Polêmicas
CASO BANESTADO
A série sugere que o escândalo do Banestado, esquema de remessa ilegal de recursos para o exterior, deu-se durante o governo Lula, a partir de 2003. Na verdade, ele ocorreu durante o segundo governo de Fernando Henrique Cardoso e foi investigado em 2003.
IMPEACHMENT
Em vários momentos de O mecanismo, o senador Lúcio Lemos (Aécio Neves) conspira com o vice-presidente Samuel Thames (referência a Michel Temer) para derrubar a presidente Janete Ruscov (Dilma Rousseff).
SANGRIA
Frase dita por Romero Jucá, do MDB, um articulador do impeachment de Dilma Rousseff, “estancar a sangria” (referência a investigações e prisões) é atribuída ao personagem João Higino, que remete ao ex-presidente Lula.
Quem é quem
JOÃO HIGINO
Ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva
JUIZ PAULO RIGO
Juiz Sérgio Moro
JANETE RUSCOV
Ex-presidente Dilma Rousseff
SAMUEL THAMES
Presidente Michel Temer
LUCIO LEMOS
Senador Aécio Neves
MARCO RUFFO
Gerson Machado, agente da Polícia Federal
RICARDO BRECHT
Empreiteiro Marcelo Odebrecht
MARIO GARCEZ BRITO
Ex-ministro da Justiça Marcio Thomaz Bastos
TOM CARVALHO
Empreiteiro Leo Pinheiro
PENHA
Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara dos Deputados
PETROBRASIL
Petrobras
POLÍCIA FEDERATIVA
Polícia Federal
MFP
Ministério Público Federal (MPF)
PROCURADORIA-GERAL REPUBLICANA
Procuradoria-Geral da República (PGR)
Grande parte da celeuma se deve à cena em que a frase “estancar a sangria” sai da boca de João Higino, personagem inspirado no ex-presidente Lula. Na vida real, a afirmação foi feita pelo senador Romero Jucá (MDB-RR). Um dos principais articuladores do impeachment, o político pernambucano radicado em Roraima se referia à necessidade de pôr um freio às ações da Lava-Jato.
Lançada neste ano eleitoral, em meio à intensa polarização política e guerra nas redes sociais, a produção despertou a ira da ex-presidente Dilma Rousseff. Ela acusou: “A série O mecanismo é mentirosa e dissimulada. O diretor inventa fatos. Não reproduz ‘fake news’. Ele próprio tornou-se um criador de notícias falsas.”
Lula afirmou que pretende processar a Netflix. Ele teria proferido a ameaça em passagem por Curitiba. “Nós vamos processar a Netflix, nós não temos que aceitar isso. Eu não vou aceitar (...) Eles produziram uma peça que é mais uma mentira”, acusou.
Sobrou para a Netflix, alvo de uma campanha de boicote a seus serviços. “A alternativa ao boicote seria o silêncio e essa não é uma opção pra mim”, diz o crítico de cinema Pablo Villaça, um dos líderes do embate com a empresa de streaming. “O problema, do meu ponto de vista, não é que um cineasta seja de direita nem as crenças políticas do Padilha. Ele tem todo o direito de se posicionar como quiser, é legítimo. Mas a estratégia narrativa desta série chega a ser mau caráter. Os fatos históricos ali foram muito deturpados. Colocar a frase do Jucá na boca do Lula é de uma má fé incrível”, afirma o mineiro, que tem 230 mil seguidores no Twitter.
Villaça diz que o lançamento de O mecanismo não foi o único motivo que o levou a interromper sua assinatura da Netflix. Explicou que se trata de um processo de desgaste que inclui fatores éticos, políticos e artísticos. “A empresa é muito eficaz em suas propagandas e em se pintar como uma corporação cool, que ama o audiovisual e a ética. Infelizmente, assim como ocorreu com o Facebook – que seguia o mesmo caminho, ao afirmar querer apenas aproximar as pessoas e se revelou uma plataforma de intolerância que passava os dados confidenciais de seus usuários a outras empresas. O serviço de streaming foi permitindo que víssemos outras facetas que tornavam difícil comprar o seu discurso”, argumenta. A Netflix não se pronunciou sobre cancelamentos e possíveis prejuízos causados pelo boicote.
Polêmicas
CASO BANESTADO
A série sugere que o escândalo do Banestado, esquema de remessa ilegal de recursos para o exterior, deu-se durante o governo Lula, a partir de 2003. Na verdade, ele ocorreu durante o segundo governo de Fernando Henrique Cardoso e foi investigado em 2003.
IMPEACHMENT
Em vários momentos de O mecanismo, o senador Lúcio Lemos (Aécio Neves) conspira com o vice-presidente Samuel Thames (referência a Michel Temer) para derrubar a presidente Janete Ruscov (Dilma Rousseff).
SANGRIA
Frase dita por Romero Jucá, do MDB, um articulador do impeachment de Dilma Rousseff, “estancar a sangria” (referência a investigações e prisões) é atribuída ao personagem João Higino, que remete ao ex-presidente Lula.
Quem é quem
JOÃO HIGINO
Ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva
JUIZ PAULO RIGO
Juiz Sérgio Moro
JANETE RUSCOV
Ex-presidente Dilma Rousseff
SAMUEL THAMES
Presidente Michel Temer
LUCIO LEMOS
Senador Aécio Neves
MARCO RUFFO
Gerson Machado, agente da Polícia Federal
RICARDO BRECHT
Empreiteiro Marcelo Odebrecht
MARIO GARCEZ BRITO
Ex-ministro da Justiça Marcio Thomaz Bastos
TOM CARVALHO
Empreiteiro Leo Pinheiro
PENHA
Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara dos Deputados
PETROBRASIL
Petrobras
POLÍCIA FEDERATIVA
Polícia Federal
MFP
Ministério Público Federal (MPF)
PROCURADORIA-GERAL REPUBLICANA
Procuradoria-Geral da República (PGR)
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