Pernambuco em todos os sons Artistas como Uana se destacaram com lançamentos que fluem entre piseiro, MPB, brega e pop, reforçando que diversidade e pernambucanidade andam juntos

Allan Lopes

Publicação: 30/12/2024 03:00

No ano em que o álbum Da Lama ao Caos, de Chico Science e Nação Zumbi, completa 30 anos, a música feita em Pernambuco continua efervescente, sempre apontando para novas direções. Prova disso é o repertório diversificado dos discos lançados neste ano, com destaque para as mulheres, que ocuparam ainda mais espaço e expandiram o espírito vanguardista do manguebeat, impondo pernambucanidade do sotaque à sonoridade.

Essa força criativa dialoga entre os veteranos, como Lula Queiroga, que mergulhou nas águas do Rio Capibaribe em Capibarium, e na nova geração. Um exemplo de ambição bem dosada na cena musical contemporânea do Recife foi o da cantora Uana em Megalomania, lançado em setembro, cujo título e sonoridade exprimiu a ânsia por expansão de ritmos e fronteiras da artista, além de capturar o sentimento de grandeza e orgulho de quem nasce em Pernambuco. “A megalomania é uma mania de grandeza, que no álbum se traduz nessa diversidade de ritmos e misturas musicais que a música brasileira contemporânea nos permite”, esclarece Uana ao Viver. Ela misturou o bregafunk local com funk paulista, afrobeat e uma pegada de house perfeita para a pista de dança.

O time de convidados representou a diversidade sonora que Uana tanto busca ao longo das 13 faixas, com a presença da baiana Rachel Reis em Esquina, o carioca Joca em À primeira vista e o rapper e conterrâneo Mago de Tarso em Eu tenho o molho. A megalomania da cantora só tende a crescer no próximo ano, com um novo projeto, shows e mais parcerias. “Eu estou muito empolgada pra esse novo ano. Quero circular por todo o país e colaborar com marcas, projetos e artistas que admiro”, enfatiza.

O futuro promissor de Uana se soma à ascensão de outras mulheres, como Joyce Alane, que embalou o coração dos solteiros e apaixonados ao longo do ano com a sua sofrência pop. Joyce colocou para fora medos, inseguranças e sentimentos de culpa em Tudo é minha culpa, seu primeiro álbum de estúdio. Após se tornar um fenômeno nas redes sociais com suas versões intimistas de bregas pernambucanos, ela retornou às origens com uma participação mais do que especial de Priscila Senna, na faixa Só não fale. Falando na Musa, ela lançou seu projeto autoral Priscila Senna na Rua – registrado em praça pública na cidade de Aracaju, em Sergipe – às vésperas do Dia dos Namorados para aquecer os corações. Já Raphaela Santos levou o brega para as ruas da periferia com o Raphaela In Comunidade, que foi gravado em shows gratuitos no Grande Recife e disponibilizado nas plataformas de áudio.

Duda Beat seguiu um trajeto semelhante ao de Uana e Joyce Alane em Tara e Tal, seu terceiro álbum, disponibilizado em abril. Ao dar o play, o ouvinte pode demandar algum tempo para assimilar a mistura de influências que desemboca na nova vibe eletrônica - mas o beat da artista não deixou dúvidas: é dançante, romântico e pernambucano, como sempre foi.

Outro pernambucano fiel à sua essência e que só teve a ganhar com isso foi João Gomes. O cantor de piseiro apresentou em junho o álbum Vaquejada Tá Na Moda e, em dezembro, lançou o EP Dois Lados, com participação de Pabllo Vittar na faixa Vira Lata, cujo clipe foi gravado no Ibura, Zona Sul do Recife. Ele ainda foi indicado ao Grammy Latino, na categoria Melhor Álbum de Música de Raízes em Língua Portuguesa, pelo disco De Norte a Sul (de 2023).

Marley no Beat, produtor influente na cena do bregafunk, reuniu os vocais de MC Fantaxma, Rayssa Dias, MC Draak, Gui da Tropa, AMun-há e MC CH da Z.O no álbum Baile do Marley Vol.1. Ao longo das 10 faixas, todas inéditas, os MCs cantam algumas músicas sozinhos e outras juntos. O disco passeou por diferentes sonoridades do bregafunk, como se fosse um verdadeiro baile. A produção fez parte de um projeto mais amplo, de manutenção de um espaço cultural, pelo período de um ano, batizado como “A mais de mil: produzindo música com responsabilidade social”, o primeiro do bregafunk a ser aprovado pelo Sistema de Incentivo à Cultura (SIC).

Almério e Martins perpetuaram a parceria na gravação do single Suma, lançada às vésperas da participação dos dois no Rock in Rio, no mês de setembro, mas foi por meio de seus projetos solos que eles conquistaram destaque nacional em 2024 - ambos na novela Renascer, da TV Globo.

No último capítulo, o público acompanhou o reencontro do casal José Inocêncio (Marcos Palmeira) e Maria Santa (Duda Santos) no plano espiritual, ao som de Jardim da Fantasia, música de Paulinho Pedra Azul regravada por Martins especialmente para a trilha sonora do remake. Já Almério realizou o sonho de dividir os vocais com a diva Maria Bethânia em Quero Você, que embalou o romance de Inocêncio e Mariana (Theresa Fonseca). A canção integra o quarto álbum solo de estúdio do cantor, batizado de Nesse exato momento, lançado em abril. São realizações para a cena musical pernambucana, que segue voando alto no cenário nacional, mas sempre com raízes fincadas em Pernambuco.