As memórias de um mestre
"Para Vigo Me Voy!", exibido no Festival de Cannes, celebra a vida, o pioneirismo e o legado artístico de Cacá Diegues, que faleceu em fevereiro
ANDRÉ GUERRA
Publicação: 21/05/2025 03:00
![]() |
Uma cronologia do melhor da cinematografia nacional se entrelaça na tela à vida de um de seus maiores pioneiros. Cacá Diegues, cineasta lendário de Xica da Silva (1976), Bye Bye Brasil (1979) e Deus é Brasileiro (2003), faleceu em fevereiro deste ano, mas o mundo terá uma nova oportunidade de mergulhar em seu legado através do emocional documentário Para Vigo Me Voy!, dirigido pelos pernambucanos Lírio Ferreira, que lançou também este ano o thriller de ação Serra das Almas, e Karen Harley. O filme foi mais uma presença brasileira no Festival de Cannes 2025, participando da competição delo prêmio Olho de Ouro do Cannes Classics.
O Viver esteve presente na exibição, que contou com a presença dos realizadores e de membros da família de Cacá. Com a sala cheia e várias menções à importância do biografado para o cinema, foi lembrado na ocasião a relação de longa data que ele tinha com o festival, tendo concorrido três vezes à Palma de Ouro e ainda marcado presença na Riviera Francesa outras nove vezes (não apenas para apresentar filmes, como também como júri.
Para Vigo Me Voy junta cenas filmadas no último ano da vida de Cacá com imagens marcantes de seus filmes e das suas personagens eternizadas, mostrando também cenas impressionantes de bastidores que revelam sua visão na direção de atores e como estava a frente de seu tempo nas discussões sobre classe no país e na representatividade negra.
Trechos restaurados mostram outros grandes realizadores que, assim como Cacá, mudaram para sempre os rumos da produção nacional de autor com o Cinema Novo - célebre como o maior movimento do cinema nacional -, coletivo do qual o alagoano fez parte significativa e que contava ainda com o expoente Glauber Rocha e nomes como Leon Hirszman, Joaquim Pedro de Andrade, Nelson Pereira dos Santos, Paulo Cesar Saraceni.
![]() | |
Em Cannes, o diretor Lírio Ferreira posa com exclusividade para Giro após seu filme "Para Vigo me voy" ser ovacionado |
“Nos conhecemos na época que fiz Baile Perfumado e ele sempre foi muito generoso e parceiro, além de ter sido influente para o trabalho de diferentes gerações”, exalta o diretor. “O protagonismo negro, a ascensão da televisão, a importância dos morros, do carnaval, a relação dele com vários grupos sociais, tudo isso demonstrava como ele esta à frente de seu tempo. E é uma honra para nós poder trazer esse afeto por ele e pelo seu cinema para a tela de Cannes, que foi a casa de tantos de seus filmes”.
Karen Harley relembra o clima de alegria das gravações. “Não sei se quem estava mais feliz era a gente de ter a oportunidade de estar com ele, ou dele mesmo em poder dividir conosco sua história de vida. Ele estava fragilizado de saúde já, mas lúcido e bem-humorado”, conta.”Cacá abriu muitas portas, não somente no estilo de filmar, mas politicamente também. Desejo que a busca por liberdade e alegria que é tão presente nos seus projetos fique com a plateia depois dessa nossa homanegem a ele”, completa Karen.
Entre músicas, imagens e sentimentos, o maior acerto de Para Vigo Me Voy é fazer o espectador sair da sessão com um pouco de Cacá dentro de si. Do olhar de quem está em Cannes, principalmente, ele reverbera em cada conquista do cinema brasileiro.