Forró como manifesto
Nome que ajudou a transformar o forró em fenômeno pop, Elba Ramalho regrava hit dos anos 1990 e defende a tradição nordestina
Pedro Cunha
Especial para o Diario
Publicação: 25/06/2025 03:00
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“Essa música sempre me tocou”, confessa Elba ao Diario. “É uma canção sobre sentimentos reais, sobre a dúvida que todos nós já enfrentamos na vida. Regravá-la agora, com a maturidade que os anos me deram, é um gesto de carinho com a Eliane, que é uma artista maravilhosa. É também uma forma de trazer essa história para meu universo”.
Mais que uma homenagem, a gravação de Amor ou Paixão reafirma uma postura constante na trajetória da artista: a defesa incondicional do protagonismo feminino no forró. “Durante muito tempo, esse espaço foi dominado por homens. As mulheres precisaram se impor com muito esforço para serem ouvidas e respeitadas. Hoje, isso está mudando, mas ainda temos uma dívida histórica. Precisamos valorizar essas vozes”, afirma, com a convicção de quem abriu portas para muitas que vieram depois.
Na letra da música, a figura da mulher que questiona os próprios sentimentos ganha nova força quando reinterpretada por Elba. “Ela não está apenas sofrendo, está se escutando, se perguntando, tomando as rédeas do que sente. Isso é empoderamento. A arte precisa acompanhar as mudanças da sociedade, e o forró não pode ficar pra trás”.
Sua tradicionalíssima turnê de São João segue pelas estradas. Ao todo, são 20 shows marcados ao longo do mês, numa verdadeira maratona que exige preparo físico, emocional e espiritual. Naturalmente energética, ela conta que acorda cedo, calça o tênis e já começa o dia com exercícios — entre academia, corrida e ioga —, sempre aliando a rotina a uma alimentação equilibrada e à fé.
Mesmo com a agenda apertada, a cantora guarda tempo para refletir sobre os bastidores da festa. Recentemente, foi convidada de última hora para se apresentar em Caruaru. “Tenho muito respeito pela cidade, mas esse tipo de situação revela algo mais profundo: precisamos valorizar quem ajudou a construir essa história. Não falo só por mim, mas por toda uma geração de artistas tradicionais”, declara a diva, de forma taxativa.
Com a expansão de outros gêneros nas festas juninas, o debate sobre o espaço do forró tradicional voltou à tona. Elba tem uma posição clara: “A convivência entre estilos é possível, mas precisa haver equilíbrio. O São João é, antes de tudo, do forró, do baião, do xote. Quando outros ritmos ocupam os palcos centrais, algo se perde. Não é sobre exclusão, é sobre respeitar as raízes”.
Ainda assim, ela defende que a tradição pode e deve dialogar com o tempo. “Amor ou Paixão é um hit dos anos 1990 e chega às plataformas digitais com uma sonoridade atual, sem perder a essência. Sempre busquei esse equilíbrio entre o clássico e o contemporâneo. O arranjo muda, mas a emoção tem que ficar.”
Aos 73 anos, Elba continua sendo uma das artistas mais celebradas do São João, não apenas pela longevidade de sua carreira, mas pela capacidade única de se renovar sem perder a essência. “Vejo muitos jovens na plateia, dançando, se emocionando. O forró atravessa gerações. É uma música de corpo, de abraço”, afirma. O segredo está na conexão afetiva que o gênero estabelece com o público. E isso, segundo ela, é o que garante ao ritmo sua permanência.