Parcerias por uma saúde eficiente Bogotá prepara expansão na estrutura hospitalar, com ajuda do setor privado, que pode virar modelo para o Brasil

Alice de Souza*
alice.souza@diariodepernambuco.com.br

Publicação: 17/03/2018 03:00

Por trás das grades de um terreno na periferia de Bogotá, na Colômbia, está uma relíquia da medicina da América Latina. O Hospital San Juan de Dios, onde outrora foi criada a primeira vacina para malária e a primeira vacina sintética do mundo. Hoje, o local consiste em um conjunto de prédios vazios, com janelas quebradas e muros pichados. Para resgatar a unidade de saúde, fechada desde 2001, Bogotá aposta num modelo que vem sendo discutido como uma possível solução para a saúde pública de todo o continente sul-americano: o compartilhamento de compromissos entre serviço público e a iniciativa privada.

Assim como outras metrópoles latinas, a capital colombiana enfrenta a transição epidemiológica no qual a prevalência de enfermidades crônicas avança diante das infectocontagiosas. Apesar de ser a terceira cidade mais populosa da América do Sul, a capital colombiana tem apenas 1,7 leito a cada mil habitantes, enquanto no Recife, por exemplo, há 5,3 leitos a cada mil pessoas. A recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) é de três a cinco leitos.

Para atingir esse mínimo, a prefeitura bogotana investirá em parcerias público-privadas. Até 2022, pretendem-se criar 1,2 mil leitos e edificar e requalificar cinco hospitais, entre eles o San Juan de Dios. “Há 20 anos não investimos em infraestrutura hospitalar. Temos a convicção de que a ajuda privada é a melhor solução, pois teremos uma administração mais eficiente e um risco de gastos fora do contrato reduzido”, opinou o prefeito Enrique Peñalosa, durante o 2º Forúm realizado para apresentar o projeto a investidores.

Bogotá se inspirou em experiências do Chile, Peru e Brasil. E pretende ser referência na região para o tema, sobretudo porque vai criar um sistema hospitalar integrado ao funcionamento da subrede de saúde: unidades ambulatoriais resolutivas (semelhantes às UPAs) e de urgência. No Brasil, ainda são poucas as iniciativas de unir o público e o privado na saúde, sobretudo no formato PPP. Pernambuco não tem projetos de usar esse modelo. Mas, se tivessem, dariam certo?

Na visão do professor de direito da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Marcos Nóbrega, o sucesso de propostas semelhantes localmente depende dos cálculos de matriz de risco. “Também é preciso de um projeto de qualidade, que pode custar até 3% do orçamento total da obra, um valor alto. E de analisar corretamente demandas e garantias”, disse. Na visão do sócio gestor de direito público do escritório Queiroz Cavalcanti Advocacia, o grande gargalo do uso de PPPs na saúde é a garantia do fluxo de pagamentos. “Ela é feita para dar lucro a quem investe. Quando a concessão é administrativa, envolve grandes recursos e a questão política passa a influir”, disse.

No caso de Bogotá, antes de lançar a licitação, o que ocorrerá em agosto deste ano, a cidade passou dois anos se planejando. “Tivemos o cuidado de não gerar pagamentos para as empresas até a entrega das obras e fazer um projeto que minimize participações de empresas sem idoneidade”, detalhou o gerente do projeto de PPP da Secretaria de Saúde de Bogotá, Alfredo Rueda. A ideia, segundo ele, é documentar a experiência e disponiblizar aos gestores públicos.

A repórter viajou a convite da Procolombia e da Invest In Bogoatá

A saúde em Bogotá
  • 7 dos melhores 44 hospitais da América Latina
  • 67% da manufatura farmacêutica da Colômbia
  • 50% da indústria de aparelhos médicos da Colômbia
  • 1 em cada cinco leitos do país
  • 1,7 leitos por 1 mil habitantes*
    *O padrão dos países integrantes da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) é 3,5 leitos por 1 mil habitantes
  • Entre 2009 e 2014, o turismo médico em Bogotá cresceu 39%
A Saúde no Recife
  • 5,3 leitos por 1 mil habitantes
  • 2,2 mil estabelecimentos de saúde
  • 39 hospitais
Fontes: Invest in Bogotá, Instituto Bancorbrás, Base de Dados do Estado, Napratica.org.br e Observatório do Recife

Entenda a diferença

PPP

  • É um contrato de prestação de serviço de médio e longo prazo (5 a 35 anos) firmado pela administração pública com setores privados
  • Em uma PPP, normalmente, a empresa fica responsável pelo projeto, assim como pelo financiamento, execução de obras e operação
  • O estado, por sua vez, paga de acordo com o desempenho do serviço prestado. Uma vez vencido o contrato, tudo é do governo.
OS
  • É uma qualificação que pode ser concedida pelo poder executivo às entidades privadas - pessoas jurídicas de direito privado - sem fins lucrativos
  • Destina-se ao exercício de atividades em saúde, atendimento ou promoção dos direitos das pessoas com deficiência, proteção e conservação do meio ambiente, promoção de atividades de desenvolvimento etc
  • Em geral, são contratos de curto prazo e firmados para fins de gestão.