A cada eleição, Brasil tem novas regras Câmara deve votar na terça mais uma mudança no sistema eleitoral

Publicação: 19/08/2017 03:00

Enquanto o Congresso avança na aprovação do distritão e de um fundo bilionário para bancar as campanhas do próximo ano, o Brasil já acumula uma mudança eleitoral a cada disputa desde a redemocratização. Entre 1993, quando acabou o prazo para a implementação das disposições transitórias da Constituição de 1988, e 2015, quando foi realizada a última minirreforma política, as regras do jogo mudaram, em média, de 18 em 18 meses.

Quase todas as alterações foram feitas em véspera de ano eleitoral. Um marco aprovado um ano antes para entrar em vigor na eleição de 1994 foi a permissão do financiamento de campanhas por empresas. Quatro anos depois, em 1997, também em véspera de disputa, uma emenda à Constituição deu a possibilidade a presidente, governadores e prefeitos de se reelegerem, o que facilitou o segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso.

Foram 14 alterações relevantes implementadas ao longo de 22 anos por meio de projetos de lei, propostas de emenda à Constituição (PECs) e decisões judiciais. Em três décadas, o Legislativo criou cinco comissões para discutir reforma política - a última delas aprovou uma série de novas normas para a eleição de 2018, que serão levadas agora ao plenário da Câmara. O Judiciário, porém, promoveu as mudanças mais relevantes.

Ao Congresso coube a aprovação de duas mudanças importantes: a Lei da Ficha Limpa e a emenda à Constituição que liberou os partidos para negociar nos estados coligações distintas à do plano nacional. Os dados estão publicados no livro Representantes de quem? (2017), de Jairo Nicolau, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Segundo cientistas políticos e juristas consultados pela reportagem, as alterações das leis promovidas pelos parlamentares revelam conveniência eleitoral e a busca por sobrevivência política.

De acordo com o cientista político da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), autor da pesquisa Dinheiro e política: A influência do poder econômico no Congresso Nacional, Bruno Reis, até 1997 as mudanças eram previsíveis, porque o sistema ainda não tinha “decantado”. Contudo, ele avalia que, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) começaram a mudar as regras, o Legislativo reagiu e, então, deu-se uma nova dinâmica. “É natural presumir que eles estejam tentando se proteger”, afirma Reis. “Há uma pressão social, pelo tamanho do descalabro, para que alguma providência regulatória institucional aconteça, mas não acho que vai acontecer. Não acredito que (a reforma política) será uma solução construtiva. Será uma manobra defensiva, que talvez agrave nossos males”, diz.

Distritão
Entre as críticas feitas pelos especialistas está o distritão. Pelo modelo aprovado na comissão da reforma política da Câmara, vencerá a eleição aquele candidato que obtiver o maior número de votos. Isso implica menor chance de renovação em um cenário em que parte dos parlamentares está citada na Lava-Jato. Já pelo atual modelo em vigor, chamado de proporcional, os eleitos são definidos com base na soma do número de votos de todos os candidatos e da legenda.

O cientista político da Universidade de São Paulo (USP) Glauco Peres é um dos críticos ao distritão, que, para ele, deverá fortalecer uma elite política. “Só político com dinheiro vai ser eleito. A gente consegue distorcer o que esperaria do sistema proporcional, que é exatamente da minoria sendo apresentada”, diz. “A gente vai ter muita dificuldade de ver uma minoria sem dinheiro, sem capacidade de articulação e acesso, eleger alguém”, afirma.

A avaliação é semelhante à da cientista política da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Silvana Krause. “Distritão associado à proibição de financiamento privado de campanhas vai ser uma coisa perigosa, porque vai ter uma concentração de recursos em poucas campanhas”, diz a professora. Segundo ela, o efeito do sistema que será transitório para as eleições de 2018 e 2020 - a partir de 2022, o Brasil adotará, se aprovado, o distrital misto - vai ser de milionários financiando suas próprias campanhas.