Fluxos de empréstimos antecipam clima eleitoral
Segundo cientista político, tramitação no Poder Legislativo estadual e municipal é "disfarçada de argumentos técnicos", mas carrega "peso do jogo sucessório"
Guilherme Anjos
Publicação: 18/06/2025 03:00
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Pedido do governo estadual segue há quase 90 dias travado pelos deputados estaduais |
Há quase 90 dias travado na Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe) apesar de tramitar em regime de urgência, o pedido de empréstimo de R$ 1,5 bilhão enviado pelo governo do estado mais uma vez não foi avaliado pela Casa e tem sido a principal pedra no sapato da governadora Raquel Lyra (PSD) na relação com os deputados estaduais. Enquanto isso, o prefeito do Recife, João Campos (PSB) precisou de somente 15 dias e conseguiu aprovar, na última segunda-feira, um crédito de R$ 900 milhões. Esse contraste expõe a dinâmica de eleição antecipada da política pernambucana que domina até a pauta do Legislativo.
Na análise do cientista político Sandro Prado, o Poder Legislativo já reflete o clima eleitoral antecipado e a tramitação dos empréstimos se tornou “uma disputa que, embora disfarçada de argumentos técnicos, carrega o peso do jogo sucessório e da rivalidade entre grupos que hoje disputam não só cargos, mas hegemonia política”.
“Esse contraste não pode ser compreendido pela lente administrativa ou técnica, o que já exigiria cautela e responsabilidade fiscal, mas sim por meio das relações de poder, alianças institucionais e da disputa pelo protagonismo”, complementou.
A bancada de oposição na Alepe, que une deputados do PSB e PSOL com bolsonaristas, aproveitou o fato de o governo já possuir aprovados créditos de R$ 9 bilhões para acusar a governadora de ineficiência e falta de transparência, sob o argumento de que o Palácio sequer contratou todos os valores já autorizados pela Casa.
Esse mesmo PSB é maioria na Câmara do Recife, e não viu os mesmos problemas com o novo empréstimo de João Campos, que já soma R$ 3,7 bilhões em empréstimos autorizados pela Casa José Mariano desde 2021 – sendo R$ 2 bilhões apenas em 2023, como apontado pela oposição, composta por vereadores do PL, Novo e PSD.
Prado avalia que os principais blocos parlamentares da Alepe permanecem sob a influência do grupo político João Campos. Em ano pré-eleitoral, quando Lyra deve começar a preparar uma maratona de entregas, o Legislativo funciona como um obstáculo para evitar que a governabilidade se destaque com o uso dos recursos.
“Para a base aliada de Campos, impedir que Raquel capitalize obras e investimentos agora é preservar o campo de disputa futura. Enquanto um avança, o outro não pode avançar tanto. É um tipo de ‘governabilidade assimétrica’. O Legislativo coopera seletivamente conforme seus interesses de longo prazo. Quando o sucesso do outro ameaça o projeto, a engrenagem emperra. O que move esses pedidos de empréstimo não é só a necessidade, mas a oportunidade”, afirmou.