O renascimento da Rua da Glória Imóveis do endereço estão sendo reformados e transformados em locais de confluência cultural e convivência

Rosalia Vasconcelos
rosaliavasconcelos.pe@dabr.com.br

Publicação: 19/04/2014 03:00

 (FOTOS: PAULO PAIVA/DP/D.A PRESS)
A rua que convida traz vida. Essa é a filosofia de um movimento, ainda tímido, que começou a despontar na Rua da Glória no final do ano passado. Formado por intelectuais e artistas, o grupo tem a proposta de resgatar a história da via - e de outras adjacentes a ela, como a Rua Velha e a Rua da Alegria - através da ocupação residencial e artística da área. Inicialmente, essas pessoas buscam devolver a dignidade da Rua da Glória a partir da recuperação dos seus espaços privados. As casas abandonadas, muitas delas de posse da Santa Casa da Misericórdia, começaram a ser alugadas e reformadas para serem transformadas em locais de convivência e confluência cultural, numa tentativa solidária e ainda solitária de resistir ao abandono e à depredação do patrimônio.

Quando o ator e designer de móveis antigos, Jorge Clésio, chegou à casa de número 300, em setembro do ano passado, o imóvel parecia um cenário de guerra. “Houve uma invasão e o morador que se instalou conseguiu destruir tudo.
O telhado estava quebrado, não existia quintal e tinha muito lixo e sujeira por toda parte”, lembra. De uma energia azul, segundo sua própria definição, a casa hoje tem vida. “Desde que vim morar aqui fiz várias reformas. Levantei uma parede, reestruturei o telhado, pintei. Agora estou recuperando os azulejos da fachada, boa parte deteriorados, e refazendo o mezzanino, que já nem existe mais. Quero devolver a essa casa a dignidade que ela teve outrora”, pontua Clésio.

Ele não chegou à Rua da Glória por acaso. Veio através de vivências na residência de número 310, de um casal de amigos: o artista plástico Rinaldo Silva e a jornalista Germana Accioly. Foram eles, aliás, os precursores desse “movimento” e os responsáveis por “apresentar” a Glória a outros artistas. No dia em que a reportagem apurava a matéria, um grafiteiro alemão trabalhava no ateliê de Rinaldo e um grupo capturava imagens para ilustrar um CD. “Compramos essa casa para ser um ateliê há 14 anos. Após avaliarmos se valeria a pena morar aqui, decidimos habitar um imóvel que era nosso, apesar de todos os problemas existentes na rua, e também para encontrar o nosso modo de viver. No começo, percebíamos que os outros moradores estranhavam. Mas hoje, quando toco piano, vizinhos param na janela para ouvir”, conta Germana. Outras cinco casas foram ocupadas por artistas e algumas transformadas em ateliê. “Numa militância cidadã, queremos humanizar essa rua aos poucos, restaurá-la, convidar as pessoas a visitá-la e a conhecer sua história. A Glória tem muita coisa a nos dizer”, ressalta Germana.

A jornalista Germana Accioly é a uma das precussoras do movimento que pretende mudar o cenário da rua
A jornalista Germana Accioly é a uma das precussoras do movimento que pretende mudar o cenário da rua
Foi inspirado no saudosismo e na arquitetura das muitas casas abandonadas e invadidas, que o artista plástico Giuliano Calife montou seu ateliê na Rua da Glória. A sua relação com o lugar, aliás, vai bem mais além de uma simples admiração: lá também abriga a história de sua família. “A casa onde hoje funciona o ateliê foi um dia a casa do meu avô e tem um apelo emocional”, confessa. Calife, no entanto, ainda não se apoderou do local enquanto moradia, apesar de desejar isso. “Ao lado da minha casa tem uma caindo. A minha também estava quando cheguei lá. Tinha sido invadida e estava com o telhado no chão. Quando meu avô morava aqui, essa rua era linda. Hoje só tem lixo e esgoto estourado. E nós queremos mudar essa realidade.”