por Jailson da Paz
jailsonpaz.pe@dabr.com.br
diariodepernambuco.com.br
Publicação: 01/10/2016 03:00
Retratos de época
Os bustos espalhados pelas ruas e praças do Recife são retratos de épocas. Remetem ao valor dado, em determinados momentos da história, a personagens públicas. Daí, a prevalência de políticos, militares, jornalistas, empresários, poetas... Gente dos séculos 19 e 20 e, senão filha da cidade ou de qualquer outro recanto do estado, ligada afetivamente a esses lugares. É o caso de Eça de Queirós, escritor português de busto fincado em uma praça com o mesmo nome do luso, na Madalena. Filho de brasileiro, Eça cresceu até os cinco anos amparado, em Lisboa, por um alfaiate e uma costureira, ambos negros pernambucanos que haviam sido escravos. O elo do escritor com essas terras, como se observa, era coisa de sangue. Ou melhor, de ama de leite. Nesse perfil se encaixa Castro Alves, poeta baiano, morador do Recife por cerca de dois anos, entre 1862 e 1864, aluno da Faculdade de Direito e crítico da política escravocrata de sua época. Pelo que escreveu, o rosto em metal do poeta pode ser visto perto da faculdade. Os personagens a que ele se referia em poemas continuaram anônimos, por décadas, na lógica dos proponentes de homenagens públicas. Nenhum escravo ou líder negro da época mereceu busto, embora se possa ver um no monumento a Joaquim Nabuco, em Santo Antônio. A estátua do escravo tem, entretanto, mais o papel explicativo do que notabilizou Nabuco: a crítica à escravidão. Político e intelectual, esse recebeu também, com justiça, um busto. Fica na Rua da Aurora. Anos depois, Nelson Ferreira furou a lógica. Ganhou um busto por contribuir com música, especialmente o frevo. E com o busto, retrato de outra época, o maestro negro teima em mostrar a cor de sua pele.
Catálogo de bustos
O Recife possui uma lista oficial de bustos. São 41, segundo a Empresa de Manutenção e Limpeza Urbana (Emlurb). Mais da metade (24) desses se encontram no núcleo histórico mais antigo da capital, os bairros de Santo Antônio, São José, Boa Vista e Recife. O da Boa Vista, montando-se um ranking municipal, estaria na liderança com 16 monumentos.
Detalhes do poeta
Estudantes que circulam pela calçada da Praça Adolfo Cirne, na Boa Vista, costumam identificar Castro Alves por detalhes comuns aos retratos do poeta. “O cabelo armado e penteado para trás e o bigode são inconfundíveis”, descreveu Mariana Lima, 19 anos. Se dependesse de placa de identificação, os estudantes teriam dificuldade em identificá-lo. A placa sumiu.
“Fora Temer”
Os pichadores não escreveram versos ao poeta e cronista Olavo Bilac, homenageado no Parque 13 de Maio na condição de patrono do serviço militar. A inauguração do monumento ocorreu em dezembro de 1983. Na base do busto, letras vermelhas e pretas se referem a um movimento de juventude comunista e palavras de ordem pela saída do presidente Michel Temer.
Quase um século
É de 1924 o busto de Oswaldo Cruz existente na praça, no Centro do Recife, que também recebeu o nome do bacteriologista. Referir-se à data é orgulho de um dos flanelinhas do logradouro: “Tem gente que, por brincadeira, pinta de batom a estátua. Acho errado, pois a estátua é coisa antiga. Está na placa que é de 1924”. A placa fica na parte traseira do monumento.
Para descanso
Dos três bustos do bairro de Boa Viagem, o do jornalista Antônio Teixeira Lima, na praça do encontro da Avenida Domingos Ferreira e Rua Visconde de Jequitinhonha, tem função além da homenagem. O busto, por estar próximo à movimentada parada de ônibus, funciona como apoio a passageiros cansados de esperar os coletivos. Ou à procura da sombra das árvores.
Sem a caneta
Desde 1975, Assis Chateaubriand figura entre os elementos da Praça da Independência, em Santo Antônio. Difícil é vê-lo de caneta em punho conforme esculpido por Abelardo da Hora. Ladrões furtaram, por mais de uma vez, a caneta do jornalista, fundador dos Diários Associados. E há um bom tempo Chateaubriand está de mão vazia.
Os bustos espalhados pelas ruas e praças do Recife são retratos de épocas. Remetem ao valor dado, em determinados momentos da história, a personagens públicas. Daí, a prevalência de políticos, militares, jornalistas, empresários, poetas... Gente dos séculos 19 e 20 e, senão filha da cidade ou de qualquer outro recanto do estado, ligada afetivamente a esses lugares. É o caso de Eça de Queirós, escritor português de busto fincado em uma praça com o mesmo nome do luso, na Madalena. Filho de brasileiro, Eça cresceu até os cinco anos amparado, em Lisboa, por um alfaiate e uma costureira, ambos negros pernambucanos que haviam sido escravos. O elo do escritor com essas terras, como se observa, era coisa de sangue. Ou melhor, de ama de leite. Nesse perfil se encaixa Castro Alves, poeta baiano, morador do Recife por cerca de dois anos, entre 1862 e 1864, aluno da Faculdade de Direito e crítico da política escravocrata de sua época. Pelo que escreveu, o rosto em metal do poeta pode ser visto perto da faculdade. Os personagens a que ele se referia em poemas continuaram anônimos, por décadas, na lógica dos proponentes de homenagens públicas. Nenhum escravo ou líder negro da época mereceu busto, embora se possa ver um no monumento a Joaquim Nabuco, em Santo Antônio. A estátua do escravo tem, entretanto, mais o papel explicativo do que notabilizou Nabuco: a crítica à escravidão. Político e intelectual, esse recebeu também, com justiça, um busto. Fica na Rua da Aurora. Anos depois, Nelson Ferreira furou a lógica. Ganhou um busto por contribuir com música, especialmente o frevo. E com o busto, retrato de outra época, o maestro negro teima em mostrar a cor de sua pele.
Catálogo de bustos
O Recife possui uma lista oficial de bustos. São 41, segundo a Empresa de Manutenção e Limpeza Urbana (Emlurb). Mais da metade (24) desses se encontram no núcleo histórico mais antigo da capital, os bairros de Santo Antônio, São José, Boa Vista e Recife. O da Boa Vista, montando-se um ranking municipal, estaria na liderança com 16 monumentos.
Detalhes do poeta
Estudantes que circulam pela calçada da Praça Adolfo Cirne, na Boa Vista, costumam identificar Castro Alves por detalhes comuns aos retratos do poeta. “O cabelo armado e penteado para trás e o bigode são inconfundíveis”, descreveu Mariana Lima, 19 anos. Se dependesse de placa de identificação, os estudantes teriam dificuldade em identificá-lo. A placa sumiu.
“Fora Temer”
Os pichadores não escreveram versos ao poeta e cronista Olavo Bilac, homenageado no Parque 13 de Maio na condição de patrono do serviço militar. A inauguração do monumento ocorreu em dezembro de 1983. Na base do busto, letras vermelhas e pretas se referem a um movimento de juventude comunista e palavras de ordem pela saída do presidente Michel Temer.
Quase um século
É de 1924 o busto de Oswaldo Cruz existente na praça, no Centro do Recife, que também recebeu o nome do bacteriologista. Referir-se à data é orgulho de um dos flanelinhas do logradouro: “Tem gente que, por brincadeira, pinta de batom a estátua. Acho errado, pois a estátua é coisa antiga. Está na placa que é de 1924”. A placa fica na parte traseira do monumento.
Para descanso
Dos três bustos do bairro de Boa Viagem, o do jornalista Antônio Teixeira Lima, na praça do encontro da Avenida Domingos Ferreira e Rua Visconde de Jequitinhonha, tem função além da homenagem. O busto, por estar próximo à movimentada parada de ônibus, funciona como apoio a passageiros cansados de esperar os coletivos. Ou à procura da sombra das árvores.
Sem a caneta
Desde 1975, Assis Chateaubriand figura entre os elementos da Praça da Independência, em Santo Antônio. Difícil é vê-lo de caneta em punho conforme esculpido por Abelardo da Hora. Ladrões furtaram, por mais de uma vez, a caneta do jornalista, fundador dos Diários Associados. E há um bom tempo Chateaubriand está de mão vazia.