Praça Oswaldo Cruz, um ponto de esquecimento Diario ouviu moradores do espaço, dependentes químicos, e também gente que usa o local para faturar algum dinheiro. Medo e desalento são constantes

Juliane Marinho
local@diariodepernambuco.com.br

Publicação: 10/06/2023 03:00

A Praça Oswaldo Cruz, no bairro da Boa Vista, Centro do Recife, além de um histórico lugar de lazer (ao menos para as gerações anteriores), tornou-se, nos últimos anos, moradia para várias pessoas em situação de rua, que usam o espaço como lar, em todas as suas implicações. A reportagem do Diario entrevistou alguns desses indivíduos para saber como eles passaram a morar no local e quais os principais problemas diários que enfrentam. Longe de suas famílias, sem renda, alguns são também dependentes químicos. Diante do esquecimento da sociedade, aguardam, com alguma esperança inexplicável, por dias melhores.

O capoeirista e artesão Mestre Willy, 51 anos, mora nas ruas há 45 anos e reside especificamente na Praça Oswaldo Cruz há 16. Ele ainda dáaulas de capoeira. Pai de três moças, de 26, 23 e 15 anos, e de um menino de apenas seis, o mestre capoeirista disse que viver na rua não foi uma opção, mas o ajuda a propagar a capoeira e a cultura em torno da luta. Ele é dependente químico e há mais de 40 anos luta contra o vício em drogas. Ele afirmou sonhar com uma casa sua. “A questão da alimentação é feita através da Secretaria de Saúde e dos meus alunos (vindos da Unibra, ali próximo), que também trazem roupas para mim. Morar na rua é difícil, sobretudo depois das 22h, quando todos vão embora. Ladrões começam a passear, armados com facas. É preciso ficar de olho”, afirmou.

Com um semblante cansado e cabisbaixo, o flanelinha Anderson, de 33 anos, conta que morava no bairro do Ibura, na Zona Sul do Recife, mas foi para as ruas também devido ao agravamento da dependência em drogas. Ele é dependente químico há 17 anos e mora na praça há sete. “A droga que me levou a estar nas ruas, porque para não morrer, tem que correr. Eu tive que sair de onde eu morava. A gente recebe doações e comidas de restaurantes próximos, que trazem quentinhas. O trabalho é através do estacionamento. Não compensa quase nunca, pois como viciado, quase tudo vai embora em drogas. Eu tenho uma expectativa de querer mudar, de voltar à sociedade, mas para isso eu tenho que deixar a droga, o que é ainda muito difícil para mim’’, lamentou.

RECOMEÇAR

Há dez anos, o flanelinha Eduardo, 60 anos, mora e trabalha também tomando conta de carros nas imediações da praça. Ele explicou que antes tinha sua casa, em Nova Descoberta, na Zona Norte, e que foi casado. Após a separação, ele saiu da residência onde vivia com a ex-companheira e foi para a rua. Ele espera um dia recomeçar. “Durante o dia, eu lavo os carros na Secretaria de Saúde, e à noite cuido dos carros dos alunos da faculdade. É difícil morar na rua. Quando não chove, tudo bem. Mas, quando está chovendo, fica um aperreio. E também o povo apronta aqui, vai embora e a gente que continua no local acaba sendo culpado injustamente”, queixou-se.

ARTESANATO

Entre os personagens da Praça Oswaldo Cruz, nem todos têm o local como “casa”. Lúcia Bernardes, 24 anos, por exemplo, confecciona e vende artesanato nos arredores. “Eu passo parte do dia na aqui, vendo meu trabalho e depois vou para a minha casa no Cabo de Santo Agostinho. Faço camisa, pulseira para vender. A praça é um lugar tranquilo”, explicou.