Um rastro de perdas deixado pela Covid-19 Cinco anos após a decretação da pandemia pela OMS, um advogado recifense lembra da perda do irmão e da mãe em um intervalo de quatro horas

JORGE COSME

Publicação: 12/03/2025 03:00

Leonardo (D) com Carlos Gilberto e Maria Zuleide: "um luto que nunca passou" (ACERVO PESSOAL)
Leonardo (D) com Carlos Gilberto e Maria Zuleide: "um luto que nunca passou"

Era por volta de 2h da manhã de 1º de julho de 2021 quando o telefone acordou o advogado Leonardo Accioly em seu apartamento em Boa Viagem, na Zona Sul do Recife. O engenheiro Carlos Gilberto Accioly da Silva Filho, de 46 anos, irmão de Leonardo, havia falecido por complicações da Covid-19 em um hospital da capital. Perto das 6h, Leonardo recebeu um novo telefonema. A mãe dele, Maria Zuleide Rocha Accioly, 80, também havia falecido por Covid-19.

“Perdi meu irmão e minha mãe em um intervalo de quatro horas”, lembra o advogado, hoje com 49 anos. Há exatos cinco anos, a Organização Mundial da Saúde (OMS) classificava a Covid-19 como uma pandemia.

Para Accioly, a ferida da perda conjunta segue aberta. “Eles foram mortos pela negligência estatal e nunca houve uma retratação”, diz. Segundo o advogado, o irmão foi quem passou a doença para a mãe. Maria Zuleide em uma visita no Dia das Mães. No dia seguinte, após se sentir mal, Carlos testou positivo.

PROTEÇÃO
“Ele entrou em uma situação crítica muito rápido. Já minha mãe foi piorando aos pouquinhos”, lembra o advogado. O engenheiro passou cerca de 45 dias internado, enquanto a genitora ficou um mês hospitalizada.

“Minha mãe sempre teve um instinto de proteção muito grande com relação ao meu irmão. E ela faleceu poucas horas depois. É como se ela estivesse esperando ele partir para ir junto”, comenta. “Esse sentimento de ajuda e de carinho por ele ocorreu até o dia da morte”.

Enquanto os parentes estavam internados, Leonardo era vacinado contra a Covid-19 pela primeira vez. Crítico do governo do então presidente Jair Bolsonaro (PL), ele chegou a escrever à época que mãe e irmão foram assassinados.

Nesses cinco anos, o Brasil contabilizou 715.295 mortes por Covid-19 e 39,2 milhões de casos confirmados, segundo dados do governo. “É como se fosse um luto que nunca passou completamente. Sobretudo porque não há uma consequência objetiva em função da negligência do Estado brasileiro com relação ao que aconteceu””, conclui o advogado.