Machismo de cinema Levantamento registrou só 17% de participação feminina entre as 250 maiores bilheterias de 2016 - discrepância reprisada no Brasil

BRENO PESSOA
ESPECIAL PARA O DIARIO
edviver@diariodepernambuco.com.br

Publicação: 21/01/2017 03:00

É Fada!: É um dos dois únicos filmes nacionais dirigidos por mulheres que ficou entre as maiores bilheterias de 2016 (Na tela/Divulgação)
É Fada!: É um dos dois únicos filmes nacionais dirigidos por mulheres que ficou entre as maiores bilheterias de 2016

Um olhar mais atento à programação dos cinemas revela que as disparidades de gênero, assim como em outros segmentos profissionais, persistem também na indústria cinematográfica. Segundo levantamento feito pelo Centro para o Estudo das Mulheres na Televisão e no Cinema (CSWTF, na sigla em inglês), da Universidade Estadual de San Diego (EUA), apenas 17% dos responsáveis pelas 250 maiores bilheterias de 2016 eram do sexo feminino, entre diretores, roteiristas, produtores, editores e afins.

Embora a predominância masculina no setor venha de longa data, ela não existe desde os primórdios do cinema. Estima-se que, até meados de 1920, metade das produções de Hollywood eram assinadas por mulheres. A provável explicação para o fato é que, até o lançamento do primeiro longa falado, O cantor de jazz (1927), a indústria era considerada menor e atraía pouca atenção. O sucesso comercial do filme com som gravado contribuiu para a mudança de cenário, levando mais pessoas - homens, entre eles - a encarar o cinema como negócio sério e lucrativo.

Nos 90 anos que separam a estreia do cinema falado das modernas salas de projeção de hoje, a presença masculina cresceu e tornou-se preponderante no meio. E o cenário atual no berço da indústria cinematográfica é pouco animador. Ainda de acordo com dados do CSWTF, houve queda no espaço para diretoras. Dos 250 filmes analisados no estudo relativo ao ano de 2016, apenas 17 tiveram mulheres na direção. Em 2015, foram contabilizadas 22 produções dirigidas por elas.

A falta de proporcionalidade persiste nas outras funções. Segundo o levantamento, nos 250 filmes analisados, elas representaram: 24% dos produtores, 17% dos produtores-executivos, 17% dos montadores, 13% dos roteiristas e 5% dos diretores de fotografia. E 35% das produções empregou apenas uma ou nenhuma mulher nesses cargos.

A presença feminina nas produções se mostrou menos díspar nos gêneros drama e documentário, com mulheres preenchendo, respectivamente, 20% e 24% dos cargos nas equipes. O índice cai nos filmes de ação (11%) e terror (12%). Outra oscilação visível é que, enquanto 8% de blockbusters norte-americanos são dirigidos por mulheres, o percentual sobre para 20% quando se trata de filmes independentes.

Até nas premiações o descompasso pode ser notado: a última edição do Globo de Ouro não teve diretoras ou roteiristas mulheres concorrendo, nem filmes dirigidos por elas entre os indicados das principais categorias (Melhor Drama ou Melhor Comédia/Musical). A exceção foi entre os concorrentes ao prêmio de longa estrangeiro, que teve a alemã Maren Ade (Toni Erdmann) e a francesa Houda Benyamina no páreo.

O desigualdade entre homens e mulheres se repete no cinema nacional, segundo números da Ancine. Dos dez filmes brasileiros mais vistos em 2016, apenas dois foram dirigidos por mulheres: É fada!, de Cris D’Amato (4ª posição) e Um namorado para a minha mulher, de Júlia Rezende (9ª colocação). Já no top 10 das maiores bilheterias do ano, incluindo lançamentos internacionais, nenhuma diretora figura.

No quadro geral dos lançamentos comerciais, as mulheres continuam ocupando menos espaço nas telas brasileiras, embora a participação tenha crescido: dos 114 filmes lançados em 2014, apenas 11 (9,6%) foram dirigidos por mulheres. Em 2015, estiveram à frente de 19 (14,8%) dos 128 longas.

Um número
27%
apenas das palavras nos dez filmes mais vistos de 2016 foram faladas por mulheres, apontou um levantamento do blogueiro e cientista Amber Thomaz publicado na revista norte-americana Newsweek.

Foco em série
A presença feminina no cinema nacional é objeto de estudo da série documental para a TV Mulheres em quadro, em desenvolvimento. A produção pernambucana em sete episódios terá como personagem central a atriz, diretora e produtora portuguesa Carmen Santos (1904-1952), uma das primeiras mulheres a produzir e dirigir filmes no Brasil. “É sobre a representação da mulher no cinema e a participação da delas, na frente e por trás das câmeras”, diz Sérgio Dantas, um dos realizadores. O documentário já tem o piloto gravado e contará com mulheres na direção, como Katia Mesel e Adelina Pontual.

Mulheres e Oscar
O Oscar tem histórico de hegemonia masculina nas categorias não relacionadas a atuação
  • 4 mulheres foram indicadas em Melhor Direção nas 87 edições. A primeira, Lina Wertmüller, foi nomeada em 1977 pelo filme Pasqualino sete belezas. As outras indicadas foram Jane Campion (O piano, em 1994) e Sofia Coppola (Encontros e desencontros, em 2004).
  • 1 única mulher saiu premiada no Oscar como diretora: Kathryn Bigelow (foto), com Guerra ao terror (2010).
  • 19 vezes indicada ao Oscar, Meryl Streep é a recordista em número de nomeações por atuação. O segundo lugar da lista é Jack Nicholson, com 12 indicações.
  • 8 estatuetas do Oscar ganhou a figurinista Edith Head, a mulher mais premiada da história da Academia.