O tempo parou nos Big Bens recifenses
Referência de gerações de trabalhadores e transeuntes, relógios de antigos prédios aguardam horas melhores
JAILSON DA PAZ
jailson.paz@diariodepernambuco.com.br
Publicação: 07/01/2017 03:00
Relógio do prédio dos Correios, na Avenida Guararapes, poderá funcionar após nova licitação. Carrilhão da Faculdade de Direito do Recife, em frente à Rua Riachuelo, testemunhou momentos chaves na história de Pernambuco |
No relógio da torre da Faculdade de Direito do Recife, na Boa Vista, os ponteiros emperraram em 12h27. De tão distante, há quatro ou cinco anos, a quebra se perdeu nas lembranças dos que trabalham e estudam na escola ou dos que marcavam o ritmo da vida pelo carrilhão. Foi o desgaste de décadas de movimentos repetitivos, o mesmo mal que prendeu as horas nos relógios dos Correios e da antiga sede do Diario de Pernambuco, em Santo Antônio, da Torre Malakoff, no Bairro do Recife, e da Fábrica Tacaruna, em Campo Grande.
“É automático. Se passo em frente à faculdade, olho para ver a hora”, confessa a professora Regina Oliveira, 43 anos. O hábito de reparar a torre vem da infância, quando ela, moradora de Olinda, acompanhava os pais em compras no Centro da capital. Era um tempo, assim como hoje, marcado por um relógio que preserva o maquinário original. A diferença é que no passado, como observa Regina, o relógio da Faculdade Direito do Recife guiava as horas de quem trafegava pela Rua do Riachuelo. “Era lento feito relógio de corda de manual, mas a gente conseguia ver que se movimentava, ao contrário de hoje.”
Em 1912, quando inaugurada a faculdade, o carrilhão estava lá. Foi um dos atrativos do prédio, tombado nacionalmente. Na época, já existiam no Recife os relógios da Torre Malakoff, da Fábrica Tacaruna e da Fábrica da Macaxeira - os três da segunda metade do século 19 - e o do Diario de Pernambuco, de 1903. Lá, na fachada voltada para a Riachuelo, o carrilhão deve permanecer. Frente à dificuldade de reparos, a dúvida é por quanto tempo continuará funcionando com a mecânica original. As velhas máquinas, Brasil afora, estão dando lugar às eletrônicas. Venha a ser qualquer a opção, a diretoria da faculdade ainda não sabe quanto custará o conserto, mas, segundo o diretor Francisco de Queiroz, o serviço está incluído no processo de restauro do prédio.
Recuperado, o relógio da Torre Malakoff, no Bairro do Recife, foi. Substituíram o maquinário inglês por um eletrônico. Deu resultado. Os ponteiros do relógio de dupla face retomaram os movimentos, mas novamente estancaram. Marcam 1h21. Isso inquieta o motorista José Rogério Correia Batista, 59. Quando criança, ele subiu a torre para ver o pai, Airton Correia Batista, consertar o relógio. “Meu pai era motorista da Capitania dos Portos, e entendia de mecânica. Sempre que o relógio parava, ele ia ajeitar”, revelou. O reparo de que fala José Rogério aconteceu nos anos 1960. O último enguiço ocorreu há cerca de seis anos.
Desde então, o relógio deixou de ser guia dos flanelinhas e dos turistas. Nesse período, também deixou de ser avistado das embarcações atracadas no Porto do Recife. Por descuido com a paisagem, permitiu-se construir um edifício no Cais do Porto de altura superior à torre. “As embarcações, até o início do século passado, anotavam nas cartas náuticas a hora vista no relógio”, revelou Conceição Santos, gestora da torre. O relógio era um farol do tempo.